31 de março de 2014

QUANDO EU ERA VIVO (2014)

Sempre me incomodei com o fato de certas religiões ficarem falando que o Diabo é isso, que o Diabo é aquilo e, quando nos damos por conta, o Capeta foi muito mais citado naqueles momentos do que as próprias boas ações de Jesus Cristo. Não me surpreenderia se tudo isso fosse algo subliminar nessas missas, sendo que não podemos julgar o livro pela capa. O que estou querendo dizer, para início de conversa, é que nem tudo é o que aparenta ser e é exatamente isso que representa o filme brasileiro Quando Eu Era Vivo.

No mais novo trabalho de Marco Dutra (de Trabalhar Cansa, 2011), acompanhamos Junior (Marat Descartes) retornando para a casa do pai (Antonio Fagundes), após ter separado da esposa. Na residência, além de ter a presença de Bruna (Sandy Leah) uma estudante de música que está alugando um quarto, Junior começa, de uma forma gradual, a destrinchar coisas antigas que lhe fazem relembrar do passado, quando convivia com o seu irmão e a falecida mãe. A partir daí, se inicia uma transformação (aparentemente) negativa, tanto de Junior, como também do ambiente da residência.

Se no seu filme anterior Dutra havia apenas namorado o clima do gênero fantástico, aqui todos os ingredientes que fazem desse tipo de filme um sucesso estão lá: ambiente claustrofóbico, fitas de vídeo, fantasmas, terror psicológico, mulher com cabelos pretos, etc. Mas o que diferencia das produções norte americanas, é que aqui tudo parece crível, sendo que há pouquíssimos momentos que algo soe inverossímil e, com isso, nós compramos a ideia de que realmente algo de estranho está acontecendo naquele apartamento.

Muito disso talvez se deva ao baixo orçamento (R$ 500 mil), o que fez com que o diretor não se preocupasse em criar efeitos visuais que nos possa convencer, mas sim se dedicando a criar uma boa história (baseado na obra Lourenço Mutarelli) na qual atiça a nossa curiosidade. O interessante é que mesmo a produção possuindo ideias já usadas em outros filmes, nós somos brindados com certos folclores brasileiros ao serem inseridos na trama, desde o sinistro boneco Fofão, como também os discos de vinil que, tocando de traz para frente, se ouvia outras coisas bem sinistras nos anos 80. É ai que o filme toca no assunto do subliminar, que nem tudo que a gente acha é o que realmente está acontecendo.
Acreditamos por um momento que Junior está enlouquecendo, pois ele acredita cegamente de que algo de ruim aconteceu com sua mãe e irmão (que se encontra em um manicômio) e sua relação com o seu pai começa a cada vez se tornar mais dúbia. Nada disso, claro, funcionaria se o pequeno elenco não fosse bom, mas cada um consegue um desempenho que cumpre com as expectativas. Marat Descartes já havia me surpreendido em Trabalhar Cansa, mas aqui, qualquer similaridade com relação ao personagem que ele havia atuado no filme anterior de Dutra é jogada de lado, já que ele simplesmente se encarna no personagem e se torna a verdadeira alma cheia de conflitos do filme em busca de respostas. Antonio Fagundes dispensa as apresentações, pois sabemos que ele sempre cumpre com louvor cada papel que atua.
O que, talvez, mais surpreenda no filme é a presença da cantora Sandy funcionar na produção: dona de uma voz de sucesso no mundo musical, Sandy jamais convenceu como atriz em si, mas graças ao dom que tem pela música, os momentos em que ela solta voz (que são momentos cruciais para a trama), acabam se tornando grandiosos para o filme. É ai que volto com o fato de não subestimar o livro pela capa, já que Marco Dutra colocou todas essas peças no tabuleiro para a gente se preparar por uma trama, cujo final começamos a moldá-lo em nossas mentes. Mas aí, quando chegamos à reta final, percebemos o quanto fomos enganados e nos pegamos completamente atônitos pelo imprevisível que nos foi apresentado.

No final das contas, Quando eu era Vivo pode ser interpretado de duas maneiras: como um simples filme de fantasmas e possessão, ou um verdadeiro jogo de palavras subliminares, para nós seguirmos em linha reta, mas então nos darmos de encontro com a cara no muro e isso, acredite, é um grande elogio.


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