20 de fevereiro de 2015

SNIPER AMERICANO (American Sniper, 2014)

Clint Eastwood é direitista assumido e seus personagens mais famosos do cinema (como o estranho sem nome da trilogia dos Dólares) nada mais são do que uma representação do que ele tem por dentro. Mas vivemos em outros tempos, em que o politicamente correto corre solto, para o bem ou para o mal e aquela imagem de heróis americanos patrióticos se tornaram uma imagem pálida perante o fato que, se deve sim, respeitar todas as nações, mesmo quando elas guardam pessoas violentas e que agem sem pensar nas consequências. No seu mais novo filme como diretor, Sniper Americano nasceu para ser odiado ou defendido, em que dá valor em temas defendido por direitistas americanos, mas que ao mesmo tempo não esconde as consequências por defender tais valores para alguns ultrapassados.

Chris Kyle (Bradley Cooper) é um texano, criado por um pai severo, mas que o ensinava a defender o mais fraco, não importando as consequências. Tinha o desejo no principio de ser um peão de rodeios, mas ao mesmo tempo cresceu em volta de armas dentro de casa, tornando-se então um atirador de elite das forças especiais americanas. Após o 11 de Setembro, Chris decide então com unhas e dentes defender no que ele acredita: acabar com os selvagens que ousaram em tentar destruir o seu país que ama.

O termo “selvagem”, inclusive, é dito algumas vezes pelo próprio protagonista quando está em missão, como se fosse um caubói do cinema de antigamente que ia matar índios, antes os grandes vilões dos primeiros anos do cinema. Porém, Eastwood sabe no vespeiro que está se metendo que, ao mesmo tempo em que coloca na tela um personagem que defende certos valores duvidosos, por outro, coloca ele em dilemas, que o fazem sua saúde mental ficar na corda bamba. A cena em que ele se vê obrigado a matar uma mãe e menino que, revezam segurando uma bomba, é desde já chocante e que abre o filme, mas ao mesmo tempo ocorre um flashback, mostrando os caminhos que o levaram até ele chegar naquele ponto.

O único caminho para a sua redenção pessoal é buscar uma paz ao lado de seus filhos e da sua esposa (Sienna Miller), mas uma vez que fica em casa, acaba sempre encarando as notícias da guerra na televisão, o que faz então sempre retornar para o outro lado do mundo. Ao longo da projeção, se percebe que a guerra abre caminho para o horror, se tornando uma droga e tudo que resta para o protagonista é seguir exatamente o que o seu pai lhe ensinou, de defender o próximo. O percurso é árduo, violento e fazendo Chris se tornar o mais letal atirador da historia americana (160 mortes no total) e se tornando para os seus colegas uma lenda.
 
Clint Eastwood não poupa esforços para fazer o melhor filme de guerra para ele, fazendo das imagens da câmera se tornarem tremulas, como se outro soldado estivesse carregando ela e indo atrás dos seus colegas. Com uma montagem elegante, o filme possui agilidade surpreendente, fazendo com que a gente não sinta as mais de duas horas de projeção. Não faltam momentos de pura tensão e adrenalina: a sequência que ocorre um grande tiroteio em meio a uma tempestade no deserto é desde já fantástica.

Mas, se num primeiro momento dá a sensação de dever comprido, o filme não esconde suas sequelas, que vai desde soldados com pernas ou braços amputados, há um estado de mente perturbada devido aos horrores que presenciaram. Chris Kyle acaba se tornando uma pessoa não muito diferente de outros veteranos que vieram de outras guerras (como o do Vietnã), embora não admita em nenhum momento que a culpa é do governo que ele protege. Querendo ou não, Chris Kyle é uma vitima de um país que enriquece com a guerra que, por vezes não pertence a ela, de uma cultura fortalecida pelo medo e que faz com que inúmeras famílias convivam com armas dentro de casa.

É claro que diferente de outros filmes como o documentário Tiros de Columbine, o filme não diz de forma explicita de como é errado esse universo contemporâneo das armas daquele país, mas sim de uma forma bem subliminar: a cena em que o protagonista não esconder um olhar pouco lúcido e brincando com a sua esposa com uma arma carregada, sintetiza como ainda estão despreparados aquelas pessoas que nasceram e cresceram numa sociedade em que se ensinou que, o mais forte sempre é aquele com a arma na mão.

Com a melhor interpretação de Bradley Cooper na carreira, Sniper Americano é um filme que irá dividir a opinião de tudo e a todos, mas que ao mesmo tempo irá gera os melhores debates e nascendo então uma boa dose de reflexão.


19 de fevereiro de 2015

SNIPER AMERICANO - Trailer Legendado

SNIPER AMERICANO 19 DE FEVEREIRO NOS CINEMAS



Data de estreia: 19/02/2015
Gênero: Drama
Distribuidora: Warner Bros.
Direção: Clint Eastwood
Elenco: Bradley Cooper, Sienna Miller, Luke Grimes e Kyle Gallner

Sinopse: Membro das Forças de Operações Especiais da Marinha dos Estados Unidos, Chris Kyle é enviado para o Iraque com uma única missão: proteger seus irmãos de armas. Sua precisão salva inúmeras vidas no campo de batalha e as histórias de suas corajosas façanhas se espalham até que ele receba o apelido de "Lenda”. No entanto, sua reputação também está crescendo por trás das linhas inimigas, colocando sua cabeça a prêmio e tornando-o alvo principal de insurgentes. Ele também está enfrentando um tipo de batalha diferente à frente de seu lar: se esforçando para ser um bom marido e bom pai mesmo estando do outro lado do mundo. 
Apesar do perigo e do preço pago pela sua família deixada em casa, Chris serve por quatro angustiantes vezes no Iraque, personificando-se no lema "não deixar ninguém para trás" nas Forças Especiais da Marinha. Mas ao retornar para sua esposa, Taya Renae Kyle (Sienna Miller), e para as crianças, Chris descobre que é a guerra que ele não pode deixar para trás.

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18 de fevereiro de 2015

DOIS DIAS, UMA NOITE (Deux jours, une nuit, 2014)


Os diretores e irmãos franceses Jean-Pierre e Luc Dardenne já são reconhecidos internacionalmente por seus filmes extremamente artísticos. Esse ano, pela primeira vez, eles viram uma de suas obras ser, merecidamente, indicada ao Oscar. E não importa que isso seja alcançado somente por causa de Marion Cotillard. 

É complicada a situação da protagonista Sandra (Marion Cotillard) que após um período afastada do trabalho por motivos de saúde se depara com o desemprego eminente. Ela é motivada por uma colega de trabalho e marido a lutar para manter esse emprego. Então ela acaba indo de porta em porta pedir para esses colegas que votem a seu favor para que assim permaneça com seu emprego, mas para isso eles terão que abrir mão do abono salarial generoso que para muitos é uma salvação. 

É angustiante ver ela ter que se humilhar para pedir isso, ela tem que se desprender de seu orgulho em cada porta que se abre ou fecha, afinal ela entende a posição deles, mas precisa lutar pela sua também. A jornada da personagem entre negativas e apoios é sofrida, violenta e reveladora. Sandra encontra apoio onde menos imaginava e indiferença onde sempre teve certeza de acolhimento. Conceitos de solidariedade, coletividade e empatia (a difícil tarefa de se colocar no lugar do outro) acompanham a história que em raríssimos momentos nos levam ao riso.

O contínuo processo de cura dos deprimidos a travar uma luta diária por sua existência parece ser o objetivo da personagem. O destaque fica pelo papel amoroso e companheiro de seu marido, seu grande protetor e incentivador. Notamos no filme os poucos amigos de Sandra, pouquíssimos por sinal, que se mostram realmente anjos da guarda, tal como na vida real. 

Com uma Europa em crise nos tempos atuais, o grande mérito dos irmãos Dardenne é trazer à tona essa história que beira ao absurdo, mas que pode realmente acontecer a todos nós e de diversas formas algum dia.


12 de fevereiro de 2015

MISS VIOLENCE (2013)

Cortinas semiabertas, lâmpadas amarelas e carpetes muito limpos criam a cena: uma família de classe média, em algum lugar da Grécia, dissimula um cotidiano de muita violência em tons pastéis e álbuns sorridentes. Miss Violence, o último filme grego a ganhar destaque nos festivais internacionais, é pesado e discreto.

Dirigido por Alexandros Avaranas, Miss Violence é carregado de dor e sofrimentos internos. O mal-estar é construído de maneira progressiva pelo roteiro bem desenhado e argumentos bem articulados, apresentados em uma ordem cronológica surpreendente. Impactante seria uma boa descrição.

O cinéfilo assume um papel de coadjuvante nesta produção, pois sente o clima pesado o tempo todo. A perturbação aflora ao longo do filme e o mistério dá lugar ao asco. A impotência e a falta de esperança de uma sociedade são expostas por uma família fora do convencional. Aparentemente uma família grega comum, com aspectos tradicionais, é comandada pelo patriarca. A filha e suas netas apresentam, ao longo da película, aspectos conflitantes. Nestes pontos, o mal estar vai sendo construído através da figura autoritária e machista do chefe da família.

Conforme a trama de Miss Violence segue adiante, o drama atinge níveis irreversíveis. O filme caminha crescente até chegar ao pico. O extasiante é que este extremo é mantido por muito tempo. Até o final da história, a impotência, o desespero e outros sentimentos explodem em lindos planos com bela fotografia.

O primeiro mérito do filme que deve ser destacado está em sua abertura, que já inicia a narrativa com uma cena de puro impacto. O ponto de reviravolta é sonorizado pela voz de Leonard Cohen em Dance me to the end of love, que prenuncia o suicídio da menina Angeliki, acontecimento que começa a denunciar o pacto de silêncio que a família guarda há décadas. A construção quase geométrica da cena segue no filme inteiro. Os enquadramentos são muito bem calculados, com muitos planos abertos que mostram a impecabilidade ordeira da direção de arte.
O conjunto de planos com trilhas adequadas passam contrastes e diversos significados para cada ato da tragédia familiar. A impotência exposta gera ações e reações que surpreendem até o fim do longa. Já a impressão do espectador é clara. O incomodo presente chega a impedir elogios no fim das sessões. Justamente por isso, a película atinge seu objetivo e impressiona, causando mal estar latente.
O longa funciona como uma denúncia, sendo mais uma forma de escancarar esta violência silenciosa do que uma busca investigativa por motivo, culpado, e cena do crime. Mesmo trazendo cenas explícitas perto do final, ele consegue ser ainda mais brutal com portas se fechando, rezas na mesa do jantar e com uma câmera parada no corredor de um apartamento. Treinar bem os atores é um dos méritos que garantiu a Avranas o prêmio de melhor cineasta. No lugar de criar um drama cheio de choros, gritos e gestos pantomímicos, os atores buscam a eliminação de qualquer fala em tom desregular, gestos efusivos e expressões fortes. A postura da família, que funciona de maneira quase mecânica e muito bem pensada, causa sempre estranhamento e é sempre evidenciada com a espontaneidade de personagens que não fazem parte do núcleo central.

Miss Violence é pesado, mas não procura escandalizar. A aparente normalidade que o filme vende não deixa a história ser lida como absurda, no sentido de excepcional. Apesar de toda a violência, tem o cuidado de não criar um distanciamento entre o público e os personagens, permitindo que criemos empatia e instigando a discussão para fora do cinema. O que ele tem de absurdo consegue ser transposto e pensado para realidades mais comuns, mas não menos violentas.


11 de fevereiro de 2015

Selma - Uma Luta pela Igualdade (2014)

No sentido biográfico, Selma apresenta o modelo clássico de biografias que o cinema americano gosta de vender, tanto no roteiro redondinho e bem apresentado quanto na maneira de filmar próxima ao protagonista e nos grandes planos em gruas para cenas de multidões. O que o destaca entre as cinebiografias que tem chegado nesta temporada (vide O Jogo da Imitação) é a maneira de abordar Martin Luther King, Jr. e o período escolhido para contar a história. 

Selma retrata Martin Luther King Jr. com as mesmas características humanas de humor, frustração e exaustão que Lincoln (de Steven Spielberg) conferiu a seu Presidente, mas sem perder seu lado político, do militante movido pela razão. Esta humanidade identificável eleva as ações de King e seus esforços. O ator David Oyelowo ajuda nessas características, evitando idealizar o personagem apenas com uma atuação previsível, deixando-o contido, mas ao mesmo tempo conseguindo transmitir através de silêncios e do seu olhar.

A época escolhida onde se passa a história também merece atenção na biografia. Ao invés de simplesmente explorar momentos conhecidos como sua morte, ou usar o discurso “I Have a Dream”, a diretora Ava DuVernay escolheu um momento importante, mas dentro da proposta do sentido político: a marcha de Selma a Montgomery, no Alabama, pelo direito do voto aos cidadãos negros, episódio de inúmeros conflitos políticos entre o presidente e os governadores e dentro da própria militância negra pelo uso ou não da violência. 

Tecnicamente, o filme tem mais alguns destaques. A fotografia é perfeita, com uma luz muito bem elaborada tanto em cenas escuras quanto em momentos à luz do dia (enfrentamento na ponte). Filmado no local em que os eventos realmente aconteceram, o filme é perfeitamente encenado, ainda que os acontecimentos tenham sido mais chocantes do que os retratados na tela. Os efeitos sonoros são bem explorados nas cenas finais, desacelerando o ritmo ou retirando o diálogo e o som ambiente nos momentos necessários. Particularmente achei que a diretora DuVernay se superou nos detalhes do filme, sua direção é precisa. 

Um filme que vale ver não só para conhecer uma parte da história de Luther King, Jr, mas também para ver uma produção muito bem feita e que mereceu ganhar uma vaga no Oscar em ultima hora.


10 de fevereiro de 2015

O Jogo da Imitação (The Imitation Game, 2014)

Infelizmente não basta ser um gênio, pois às vezes se paga um alto preço por ter esse dom. Assim como outras cinebiografias da temporada (como Teoria de Tudo) o dom de uma pessoa pode ser vasto, mas nem por isso deixará de passar por percalços. O Jogo da Imitação escancara que, por mais que façamos algo de bom para o próximo, sempre haverá aqueles que contra-atacam de uma forma cega e preconceituosa.

Ao criar um aparelho para decifrar códigos nazistas, Alan Turing (Benedict Cumberbatch) não somente salvou milhares de vidas durante a Segunda Guerra Mundial, como também é responsável pelo primeiro computador criado na história. Infelizmente esse importante conhecimento foi por vários anos desconhecido pelo público, devido a uma sociedade homofóbica da época que era vasta, sendo que pessoas com conotação homossexual eram perseguidas e mortas injustamente durante décadas. O filme, ao desvendar a real natureza de Turing que, foi um gênio muito a frente do seu tempo, mas que infelizmente devido ao fato de ser gay, foi caçado no inicio dos anos 50 e tendo um destino trágico.

Embora pouco conhecido, o diretor norueguês Morten Tyldun soube muito bem conduzir as duas linhas de história (Segunda Guerra e início dos anos 50), para termos uma profunda análise dos fatos e sem que a gente se confunda nas idas e vindas da história. Interpretado com garra por Benedict Cumberbatch que confere ao seu personagem uma fraqueza quase infantil, mas sem soar falso em nenhum momento, Turing tenta se agarrar ao seu talento, mas nos momentos em que precisa mais do que isso para seguir em frente, ele acaba se transformando numa vítima, perseguido por seus desejos sexuais que, aparentemente, ele mesmo não consegue entender rapidamente se comparado aos códigos da guerra no qual ele trabalha.

O filme se apóia em dois lados, entre o tempo de guerra e aquele momento em que as pessoas não são condenadas por sua ideologia em tempos difíceis, mas sim por opções pessoais que, absurdamente, ganham a perseguição do Estado que deveria se preocupar com outras coisas mais graves. Esse é mote principal do filme: das escolhas difíceis que envolvem a perda de milhares de vidas numa batalha, para a intervenção do dia a dia de alguém que não afeta em nenhum momento outras pessoas, mas que devido a sua opção sexual, é perseguido como se fosse um criminoso.

Com um elenco afiado (Keira Knightley novamente cumpre bem o seu papel em filmes de época) e com uma reconstituição de época perfeita, O Jogo da Imitação é um filme para ser visto por todos, até mesmo pelos políticos homofóbicos atuais que, usam a bíblia como arma, em vez de pregar uma boa e justa política. A pergunta que fica no ar é: será que ao saberem que o criador do computador era gay, esses políticos de hoje deixariam de usar os seus computadores pessoais? Definitivamente tem gente que nasce em época errada!


6 de fevereiro de 2015

A ENTREVISTA (The Interview, 2014)


Filmes podem não mudar as pessoas, mas podem muito bem quase provocar uma guerra hoje em dia. Quando souberam que a Sony iria lançar um filme em que o Ditador Kim Jong-um seria o grande vilão da trama, não demorou muito para o mesmo contra-atacar o próprio estúdio. Hackers invadiram os computadores da produtora, vazando alguns filmes, pegando informações de futuros projetos e ameaçando com ataques terroristas.

A situação ficou tão feia, que o próprio presidente dos EUA teve que se manifestar a respeito, contra atacando e dizendo que o estado não negocia com terroristas. Polêmicas à parte, vendo o filme agora, percebo que foi tudo uma tempestade no copo d’água e acredito que o filme passaria meio em branco entre o grande público. Não que o filme seja ruim, pois ele tem os seus méritos em não fazer somente uma critica sobre um dos países mais fechados do mundo, como também com relação à própria sociedade norte americana que idolatra a mediocridade vinda de celebridades conhecidas.

Na trama, James Franco e Seth Rogen vivem apresentador e produtor de um programa de TV, respectivamente. Eles estão acostumados a lidar com celebridades em situações ridículas e fazem de tudo para tirar delas determinados segredos para dar audiência. De uma hora para outra, descobrem que o Ditador da Coréia do Norte é grande fã do programa e é então que eles decidem entrevistá-lo. Ao mesmo tempo, o governo americano os obriga a participar de uma missão, cujo objetivo é assassinar o próprio Ditador.

Antes de qualquer coisa, é preciso assistir a esse filme sem levá-lo a sério em nenhum momento, mas sim curti-lo de uma forma descompromissada. Parceiros de sucessos em filmes como Segurando as Pontas e É o Fim, James Franco e Seth Rogen se saem bem novamente interpretando personagens que, ligeiramente, são os mesmos tipos que eles já atuaram em outros filmes. Muitos dizem que esse é o pior desempenho de James Franco em sua carreira, mas a meu ver ele chega a ser tão engraçado quando Rogen em cena e se compararmos esse seu desempenho com o que ele teve em OZ, nesse último ele estava muito mais caricato e sem brilho algum.

Randall Park se sai bem como o famigerado Ditador, mas que num primeiro momento se apresenta como um homem de bom coração e fazendo amizade com o personagem de Franco. As cenas em que eles curtem mulheres, bebidas, drogas e muitas brincadeiras, com certeza são momentos que devem ter gerado imenso ódio quando o verdadeiro Ditador as viu. Como cereja do bolo, os roteiristas ainda tiveram a genialidade de colocar a já clássica musica "Firework" da cantora Katy Perry na história, em cenas que, com certeza, faz com que a pessoa saia do cinema e comece a cantarolar ela compulsivamente.

Com diversas cenas satíricas que lembram outros filmes, como Frost/Nixon, A Entrevista poderia muito bem passar batido pela maioria do público, mas foi justamente o contra-ataque de pessoas que levam por demais tudo a sério, que o filme conseguiu uma fama que oscila entre sucesso e o fracasso aos olhos das pessoas. Já diz o ditado: falem mal, mas falem de mim.

5 de fevereiro de 2015

GRANDES OLHOS (Big Eyes, 2014)

Tim Burton é um cineasta autoral que, não mede esforços para injetar a sua visão pessoal, com relação ao mundo em que vive, na criação dos seus filmes. Infelizmente ele trabalha numa indústria cujas engrenagens são movidas pelo dinheiro e, portanto, nem sempre ele possui total liberdade criativa. Alternando em produções milionárias onde não consegue fazer o filme que gostaria (Alice no País das Maravilhas) e filmes menores onde mostra toda a sua genialidade (Ed Wood), Burton talvez seja um dos poucos cineastas autorais americanos que sabe na pele como deve agradar um pouco de cada lado para assim então conseguir carta branca para fazer o filme que quiser.

Essa briga pelo direito de manter intacta a sua identidade própria é vista muito bem nesse pequeno, mas tocante filme intitulado Grandes Olhos. Estamos na virada dos anos 50 para os 60, onde o homem ainda se mantém como o ser dominante de uma sociedade hipócrita e escondida num quadro azul e cor de rosa. As mulheres em si possuem o seu talento escondido, mas pela falta de coragem de saírem do armário, acabam se tornando submissas pelo lado mesquinho do sexo masculino.

Margaret Keane (Amy Adams) tem talento vindo de sua mente e que desce para os dedos, no momento que começa a pintar belas imagens de crianças com grandes olhos que nada mais são do que uma representação da sua forma de enxergar o mundo. Uma mulher à frente do seu tempo, mas que, infelizmente, ainda acredita na necessidade de um homem e, com isso, cai nas garras do salafrário Walter (Christoph Waltz), casando-se com ele. Se dizendo um artista, não demora muito para Walter se dizer o verdadeiro autor das obras de Margaret que, por sua vez, não o desmente e acaba se tornando um mero fantoche dele.

Embora seja apenas um caso, é talvez um de muitos parecidos que tenham acontecido no decorrer de décadas passadas mais conservadoras. Margaret é uma representação da mulher amarrada por regras criadas pelos homens do seu tempo, numa época em que a revolução feminina ainda era um sonho distante. Embora seja mulher, Margaret é uma representação do próprio Tim Burton, que ama o que faz, mas sempre luta para ter o direito de ir e vir como bem entender em sua carreira e chega um ponto que talvez a água transborde para fora do copo.

Visualmente, o filme é uma reconstituição perfeita de uma época mais dourada, lírica, mas que o cineasta faz questão de não esconder o seu lado hipócrita. Gradualmente esse mundo de utopia criada pela sociedade norte americana, vai dando lugar a uma realidade mais crua, no momento que Margaret começa a comandar as rédeas de sua vida e de sua obra. Claro que Walter não dá braço a torcer e ambos vão a julgamento pelos direitos autorais.

Amy Adams e Christoph Waltz estão ótimos em seus respectivos papeis. Se a primeira transmite talento e doçura através dos seus olhos, Waltz transforma o seu Walter num vilão caricato, porém divertido, mas que ao mesmo tempo sentimos nojo nos momentos em que ele controla as cordas para fazer de Margaret a sua marionete. Ambos os talentos duelam de igual para igual no ato final, nos brindando com momentos sublimes e hilários.

Se hoje ficamos arrasados por vermos que ainda há países no oriente médio que tratam as suas mulheres como gado, Grandes Olhos vêm para nos dizer que houve sim tempos difíceis para as mulheres que viveram no ocidente. Mulheres com talento em abundância, mas presas por regras impostas pela sociedade e igreja conservadora. Tim Burton nunca foi tão feminista como agora.


4 de fevereiro de 2015

Caminhos da Floresta (Into the Woods, 2014)

Ao longo das décadas, os contos de fadas sempre são apresentados de uma forma diferente para o público que vem surgindo e mudando conforme o tempo vai passando. Se determinadas passagens de contos de fadas antes eram aceitas, hoje em dia, algumas destas fórmulas estão desgastadas e dificilmente convencem essa geração atual. Caminhos da Floresta veio para fortalecer essa nova vestimenta dos contos, mesmo com os seus percalços visivelmente nítidos.

Dirigido por Rob Marshall (Chicago), acompanhamos inúmeras histórias conhecidas: Cinderela, Rapunzel, O Pé de Feijão, Chapeuzinho Vermelho e dentre outras que acabam se entrelaçando e formando uma única história. Isso somente acontece graças ao casal de padeiros (James Corden e Emily Blunt), que desejam um filho, mas sofrem de uma maldição imposta por uma velha bruxa (Meryl Streep). Para desfazer da maldição, eles precisam encontrar quatro objetos que, se encontram em determinados contos de fadas, mas que, por sua vez, acontecem dentro de uma mesma floresta.

Embora sejam contos distintos, o roteiro surpreende ao misturá-los e sem soar forçado. Muito embora, em alguns momentos, a trama soa fiel demais com relação à sua origem que é baseado numa peça da Broadway e, por causa disso, algumas passagens acabam que não se adequando bem à tela do cinema. Bom exemplo disso é a história final de Chapeuzinho Vermelho (estrelado brevemente por Johnny Depp como Lobo Mau) que, se por um lado seria verossímil num palco devido aos seus efeitos teatrais, no filme a situação soa tão forçada que seria mais prudente se a solução apresentada naquele momento não tivesse sido vista, mas sim sugerida.

Em contra partida, o filme ganha o seu público (principalmente o feminino) ao tornar as princesas apresentadas na trama, numa visão que se casa muito bem com as jovens de hoje: Cinderela (Anna Kendrick) fica indecisa em se casar ou não com o Príncipe Encantado (Chris Pine). Já Rapunzel (MacKenzie Mauzy) deseja a todo o custo viver livre e sem as amarras de sua mãe super protetora, que é a própria bruxa interpretada por Meryl Streep. São os velhos conhecidos contos, mas atualizados para esse novo mundo menos colorido.

Diferente do que aconteceu em Chicago, infelizmente, Rob Marshall não conseguiu aqui construir quase nenhum número musical que desse a vontade de sair da sala do cinema e começar cantarolar. Embora as cenas sejam muito bem feitas, faltou aquela paixão para se criar algo que entrasse nos nossos ouvidos e que se mantivesse soando lá por um bom tempo. Felizmente, Meryl Streep é a única que se sobressai na voz, em momentos que conhecemos melhor a origem de sua personagem e despertando em nós certa simpatia por ela.

Com um final em que os destinos de alguns personagens se tornam curiosamente inusitados, Caminhos da Floresta veio mais para fortalecer essa nova onda de adaptações dos contos de fadas, mesmo com todos os seus erros de percursos na sua narrativa.


2 de fevereiro de 2015

A TEORIA DE TUDO (The Theory of Everything, 2014)

Baseado no livro Travelling to Infinity: My Life with Stephen de Jane Wilde Hawking, o filme foi dirigido por James Marsh. A proposta publicitária do longa-metragem é contar a história de amor entre o gênio da física Stephen Hawking e sua ex-mulher Jane Wilde, com quem teve 3 filhos. O romance entretanto é apenas o pano de fundo, sendo que o foco da narrativa toda é a genialidade de Stephen e seu anseio por enfrentar a vida e encontrar uma equação matemática que explique a origem do universo ou, seja, uma equação que simplesmente explique tudo. A história é encantadora, cheia de momentos de emoção, recheados com o ótimo humor de Hawking que enfrenta, até hoje, com dignidade, a sua doença.

A tela abre mostrando o jovem Stephen Hawking (Eddie Redmayne, de Os Miseráveis) na Universidade de Cambridge trabalhando por seu doutorado em física. Já com alguma dificuldade motora na mão direita, ele conhece, em 1963, a estudante de poesia Jane Wilde (Felicity Jones, de O Espetacular Homem-Aranha 2). Eles começam um romance quando, num belo dia, Stephen tem uma crise e vai parar no hospital, onde é diagnosticado com a doença do neurônio motor, uma doença que lhe tirou as habilidades de falar, engolir, andar, gesticular, mas que mantém sua mente intacta.

Ao saber da previsão de Stephen tem, no máximo, 2 anos de vida, Jane declara seu amor e que está disposta a enfrentar a doença com ele. Eles se casam e ele tira com louvor o seu doutorado, com a teoria de que o tempo, no universo, deve ter tido um início e que, portanto, é possível comprovar o princípio de tudo matematicamente.

Apesar dos problemas motores se agravarem, Stephen segue sua vida, tem filhos com Jane e muda o foco de sua pesquisa, tentando provar que estava errado quando tirou seu doutorado e que o tempo não tem início, nem fim, mas que mesmo assim, a organização do universo pode ser comprovada por uma equação matemática e, mesmo se considerando ateu, não descarta que uma força superior pode ser a responsável por tudo.
Com apoio de amigos, colegas, professores e da esposa, ele lança seu primeiro livro "Uma breve história do Tempo", que lhe concedeu a grande fama internacional e o colocou como uma das mentes mais brilhantes do século XX. Ao mesmo tempo, seu casamento passa por uma crise: sua esposa inicia um romance com um regente de coral, que torna-se um grande cuidador de Hawking que, por sua vez, apesar de totalmente dependente de sua cadeira de rodas elétrica e um computador para falar, também inicia um romance com sua cuidadora.

Stephen e Jane se divorciaram antes do lançamento do livro em 1988, mas mantêm amizade até hoje. Stephen, que rejeitou o título de Cavaleiro da Rainha da Inglaterra, continua atrás de sua resposta matemática e já escreveu muitas outras obras que expandem seu pensamento (como O Universo numa casca de noz), e segue popular, tendo participado recentemente da série de TV nerd Big Bang Theory.
A produção britânica acertou ao escolher Marsh, especialista em documentários, para dirigir uma obra tão recheada com fatos biográficos. Acertou mais ainda em escolher Eddie Redmayne para interpretar o gênio Hawking. Redmayne encantou a muitos com sua voz e desenvoltura no musical Os Miseráveis, mas sua atuação fabulosa em Sete dias com Marilyn, já dava amostra de sua grandiosidade. Aos 33 anos Redmayne merece indiscutivelmente ganhar o Oscar de melhor ator. Sua atuação lembra em muito as dificuldade enfrentadas por Daniel Day-Lewis ao interpretar o pintor Christy Brown, em Meu pé esquerdo, de 1989. O restante do elenco trabalha bem, e funciona como ótima escada para Redmayne conquista seu espaço na telona, mas não há grandes destaques.

Em suma, o filme é sobre a mente de Stephen Hawking e seu romance com Jane Wild é apenas um pano de fundo para tornar a obra mais interessante e mostrar que apesar de sua genialidade, Hawking é humano, falível e dependente dos outros como qualquer um.

Um excelente filme, merece ser visto e revisto.


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