O cineasta Aly Muritiba já demonstrava bastante talento através dos seus curtas metragens como A Fábrica e o inquietante Tarântula. Em sua primeira experiência em longa metragem, Para Minha Amada Morta, traz os mesmos apuros estéticos, visual cru, com a segurança precisa das quais ele filma, sejam nos momentos do qual foca ao máximo as expressões dos personagens, como também os detalhes dos cenários em volta.
Isso se casa muito bem com inquietante trama, do qual muitos irão se identificar e conquistar, não somente a crítica especializada, como também o público e os festivais pelo Brasil e pelo mundo a fora que o filme já vem colecionando. Com uma história bem intimidadora, porém fácil do cinéfilo identificar através de outros gêneros, a trama enlaça elementos de mais puro drama com suspense, dando tempo para quem assiste conhecer e se aprofundar sobre cada personagem que, para o bem ou para o mau, são tão humanos quanto qualquer um. Sendo assim, a trama poderia ser inspirada em qualquer caso real, ou até mesmo bem próximo de você.
A trama se tem início com o fotógrafo (Fernando Alves Pinto, espetacular) que trabalha para a polícia e que está de luto junto com o filho pelo falecimento de sua esposa. Curiosamente, em nenhum momento sabemos quais foram os reais motivos de sua morte e fazendo com que a gente tire inúmeras interpretações sobre o que realmente aconteceu com ela, assim como também não sabermos ao certo como estava à relação do casal nos últimos anos. Em contrapartida, mas somente em parte, sabemos o que ela fazia nas últimas semanas em vida: através de fitas cassetes que o protagonista encontra se descobre que ela tinha um amante e gravava todos os seus momentos íntimos.
De uma hora pra outra, ele se coloca numa investigação furiosa, da qual ele se distancia, tanto do seu trabalho, como também do seu próprio filho. Isso resulta na mudança dele perto de uma família religiosa humilde e conservadora, da qual ele começa a se aproximar compulsivamente. Essa aproximação é inquietante desde o início, pois talvez o protagonista veja neles o desejo em adquirir a família perfeita da qual lhe foi arrancada, ou que mal teve tempo de realmente construí-la. É claro que a todo o momento ficamos perguntando se ele enlouqueceu e nos provocando uma angustia interior, pois ficamos sempre na expectativa sobre qual será o seu próximo passo na investida contra essa família.
Em meio a isso, o cineasta Aly Muritiba desenha para nós um clima de suspense, cujo seu cenário, a câmera jamais a ponta para nenhuma direção sem algum significado e não caindo em nenhum clichê do gênero policial por exemplo. Em vez disso, ele criou um drama policial caprichado, do qual não víamos desde o indispensável O Lobo atrás da Porta. Porém, Para Minha Amada Morta já no principio dispensa comparações, pois sua direção é refinada, casada muito bem com o roteiro e tento como trunfo uma bela fotografia criada por Pablo Baião.
Interessante é observar que, através das fitas da falecida esposa, há uma deliciosa referencia a linguagem cinematográfica. Cada VHS e cada imagem vista numa foto, desencadeia um lado obscuro até então desconhecido do protagonista. Fernando Alves Pinto (visto em filmes como Nosso Lar) nos brinda com a sua melhor interpretação da carreira, ao construir um personagem que não cai num lugar comum, mas sim faz com que desejemos cada vez mais e mais sabermos sobre qual será o seu próximo passo da trama, assim como também compreendermos a sua real pessoa.
A imagem de sua esposa perfeita pode ser vista em suas ações, desde como cuidar de suas roupas ou de seu próprio filho. Isso pode ser visto como uma crítica, ou fazer simplesmente cair mascaras da família tradicional brasileira, principalmente através da família religiosa, da qual ele se aproxima. Não existe um final ou solução fácil a ser entregue para nós de bandeja, pois a própria vida real não nos traz para nós, e por conta disso, o filme não é obrigado a fazê-lo e tão pouco nos reconfortar.
Para Minha Amada Morta não nos apresenta somente reflexo sobre as relações humanas contemporâneas, como também uma analise sobre até onde podemos ser tolerantes, tanto com o próximo, como também com nós mesmos. Desde já um dos grandes filmes nacionais do ano.
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