Nos primeiros momentos de projeção, a protagonista interpretada por Leandra Leal está relaxada ao lado do namorado, falando inglês (não espere explicação por isso) e se esquecendo por completo do mundo lá fora. Contudo, um cartão postal que ela recebe, faz com que vá de encontro com o passado para rever assuntos não resolvidos, tanto com sua família, como também de antigos amores. A partir daí, somos levados juntos numa realidade familiar, mas pouco convencional aqui.
Escrito e dirigido por Ricardo Pretti (de Estrada para Ythaca, 2010, e No Lugar Errado, 2011), O Rio nos Pertence por vezes lembra Nina de Heitor Dhalia, onde ambos os filmes possuem uma realidade filtrada, que faz parecer que determinados ambientes que conhecemos, acabam por ser apresentados de uma forma jamais vista. É como se aquela visão sempre estevisse lá, mas nunca nos demos conta, ou faz entender que há duas realidades, mas que nunca dão espaço uma para outra e somente nós, num determinado momento da vida, é que nos damos conta disso.
Entretanto, diferente de Nina, a questão não é o fato de a protagonista estar vendo coisas, mas talvez não se dando conta de onde realmente está. Numa das melhores cenas do filme (que me lembrou O Som ao Redor), a protagonista começa a rasgar uma parede que, por sua vez, se mostra ser uma grande janela que dá de encontro com a paisagem carioca. Mas o visual é sombrio, para não dizer melancólico e faz com que a protagonista grite por alguém, mas sem ser respondida.
Gritos e escuridão é que fazem também o clima da produção se tornar bem estranho, beirando até mesmo um clima de terror clássico, mas muito distante daqueles vistos no cinema americano. Na realidade, o filme de Pretti está mais para A Hora do Lobo de Ingmar Bergman, onde só faltou mesmo a protagonista dialogar com a gente. Em vez disso, ela se encontra com um amor antigo chamado Mauro e com sua irmã vivida com maestria por Mariana Ximenes, onde ambas se digladiam numa conversa reveladora e que dá uma dica (ou não) do que está acontecendo na tela.
É uma obra que poderia ser filmada da forma mais simples, mas o cineasta preferiu ir contra a maré e apresentar uma obra mais experimental, que fizesse com que a gente tirasse inúmeras interpretações do que estamos vendo realmente. Podemos até mesmo ir para um caminho fácil sobre a verdadeira natureza da jornada da protagonista, mas seria óbvio demais, então o diretor nos joga outros inúmeros detalhes para fazermos uma teia de teorias sobre inúmeros significados das sequências apresentadas. Fora o momento da janela já citada, não há como ignorar a enigmática cena da praia, onde a personagem dá a entender que está sendo puxada contra a sua vontade por algo, mas não se importando muito com isso.
Assim como o já cultuado Doce Amianto, este é mais um de muitos filmes experimentais brasileiros que vieram para ficar. Mesmo indo contra a onda de comédias que assolam nossos cinemas, são obras, como essa de Pretti, que fazem com que a trama continue em nossas mentes e nos convencendo a dar mais uma conferida na sala escura.
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