A minha noiva costuma dizer que o mal sempre se veste melhor. Bom, esse é apenas um dos diverssos argumentos que, vez ou outra, acabam nos fazendo torcer pela pessoa errada na história. Eu estava pensando sobre o assunto e cheguei à conclusão de que às vezes eu inverto as coisas e acabo torcendo pelo vilão, aqui vão alguns exemplos:
10- As Duas Faces da Lei - David "Rooster" Fisk
"Ele vai matar de novo, você sabe e eu sei."
Righteous Kill prometia muita coisa: a reunião de Pacino e DeNiro depois de O Poderoso Chefão Parte II e Fogo Contra Fogo. Dessa vez a coisa se inverte e Pacino tem a sua atuação mais contida, enquanto DeNiro explode na tela. Apesar das reviravoltas forçadas no roteiro eu tenho que admitir que o filme é interessante. Porém, a minha predileção pelo vilão vem justamente de uma falha do filme que não tenciona ser ambíguo e, ainda assim, acaba permitindo uma caracterização amigável de Pacino. DeNiro está um pouco exagerado no filme e acaba não conquistando tanto a atenção do espectador, fazendo com que eu acabasse torcendo pelo personagem de Pacino.
9- Kill Bill - Budd
"Eu não me esquivo de minhas culpas e não decido não pagar as dívidas que tenho."
Budd é um personagem especial. Michael Madsen é um canastrão (sempre foi e sempre será) a não ser quando quem o está dirigindo é Quentin Tarantino. Ele é o único ator a repetir um personagem nessa lista. Bud é o melhor personagem de Kill Bill e isso não é pouca coisa.
O que é tão fascinante no personagem é que ele legitimamente derrotou a protagonista da estória e é possivelmente o maior assassino do mundo e, ainda assim, ele está satisfeito que apenas ele saiba dessas qualidades. Ele mente que vendeu sua espada fazendo com que seu irmão pense que ele é um idiota perdedor, aceita trabalhar em um bar como leão-de-chácara, sendo constantemente humilhado por seu chefe e colegas, e ainda está acima de tudo isso. Eu diria que o personagem é muito nobre, comparado as versões cinematográficas de Ghandi ou Jesus. Ele admite a seu irmão que a Noiva merece sua vingança e que eles merecem morrer pelo que fizeram a ela, mas também pondera que ela mesmo fez coisas horríveis e merece a mesma punição, deixando que o destino escolha quem deve prevalecer.
Para mim, não há melhor maneira de se estar certo do que estar extremamente próximo de estar errado. Essa é a questão do argumento de Bud, ninguém em Kill Bill está tão certo quanto ele, nem mesmo a Noiva. E como eu poderia não torcer para um personagem que senta em seu trailer e escuta Johnny Cash?
8- Dúvida - Padre Brendan Flynn
"Mesmo que você sinta que tem certeza, é emoção, não um fato."
Dúvida é um filme poderoso, ainda que eu ache que a trilha sonora da última cena estrague o final do filme. Ele me ensinou que, às vezes, acreditamos em mentiras (nem tão) óbvias para podermos voltar ao estado normal das coisas. O filme é muito eficiente e consegue o seu objetivo: que a mais importante parte do filme se passe na sua cabeça. Aqui sim começa o meu martírio.
Simplificando a trama do filme, ficamos em dúvida se um padre molestou um garoto ou não, e o filme nos dá as ferramentas necessárias para analisarmos a questão tanto lógica, quanto emocionalmente. O meu lado lógico conclui que o padre é culpado, mas o personagem é interpretado com tanta empatia por Philip Seymour Hoffman que eu me pego pondo de lado a lógica e decidindo que ele é inocente. Se um vilão é capaz de ensinar essa importante lição, com certeza ele deveria ter ganho. O problema é que o filme é tão ambíguo que, se eu decido que o padre é inocente ele deixa de ser o vilão e caso ele seja culpado eu não poderia torcer por um molestador. Enfim, Dúvida é um filme genial e o Padre Flynn um vilão que tira o sono das pessoas, seja como um mártir injustiçado ou como um molestador assustadoramente humano.
7- Apocalipse Now - Coronel Kurtz
"Nós treinamos homens para jogar fogo em pessoas. Mas os seus comandantes não os deixam escrever "foda-se" nos seus aviões porque isso é obsceno!"
E impossível falar sobre o Coronel Kurtz sem entender Apocalypse Now, e uma frase de Francis Ford Coppola resume o filme: "Meu filme não é sobre o Vietnã, meu filme é o Vietnã".
O que dizer sobre um coronel do exército americano fadado a se tornar general que vai ao Vietnã para fazer um estudo sobre a guerra e se torna um desertor com sua própria unidade e seus próprios objetivos; é tido como Deus pelos nativos e faz com que o primeiro homem mandado para matá-lo junte-se a ele; e quando finalmente o Capitão Willard tem a chance de matá-lo, ele mesmo dá as boas vindas à morte? Kurtz não é apenas um personagem, é um estudo sobre a humanidade, sociedade e a cultura da guerra. Eu não estou completamente certo que ele deveria ter sobrevivido, mas considerando o final alternativo (em que ele e Willard se unem e combatem um ataque aéreo) acho que ele poderia ter tido um futuro melhor, ainda que menos impactante.
6- O Chacal - O Chacal
"Ooh, isso é ruim. O sangue está quase preto, isso significa que a bala está no seu fígado. Você tem uns 20 minutos de vida. Se a dor ficar muito forte para você aguentar, você pode cortar fora a sua mão. Aí você morrerá em 5 minutos."
Nesse caso eu até não acho o herói fraco e Richard Gere tem um bom desempenho como o ex-terrorista irlândes Declan Mulqueen (sem dúvida o nome mais legal de um personagem de Gere) e acho que ele deveria investir mais em papéis de ação. O problema é que seu rival aqui é ninguém menos que Bruce Willis, em sua melhor interpretação depois de Corpo Fechado. O Chacal é mil vezes mais eficiente do que Mulqueen e apesar de sua motivação (até onde se sabe) ser dinheiro ele se arrisca muito mais do que o irlândes. De qualquer maneira o filme é um embate interessante entre dois adversários a altura, mas nesse caso eu torci pelo assassino.
5 - Wall Street - Gordon Gekko
"A questão, senhoras e senhores, é que a ganância por falta de uma palavra melhor é boa. Ganância é certa. Ganância funciona. Ganância clarifica, atravessa e captura a essência do espirito evolucionário. Ganância em todas as suas formas - ganância por vida, por dinheiro, por amor, por conhecimento -tem marcado uma onda de elevação da humanidade, e a ganância - marquem as minhas palavras - não ira apenas salavar a Teldar Paper mas uma outra instituição defeituosa que chamamos de América. Obrigado."
Gordon Gekko é o melhor exemplo de vilão que rouba um filme. Charlie Sheen nem ao menos merece estar no mesmo filme que Michael Douglas. Douglas ganhou o Oscar de melhor ator com esse papel e simplesmente rouba o filme de qualquer outro ator. Gordon Gekko é mesquinho, inteligente, corrupto e assustadoramente correto em suas observações. O que dizer do único personagem a convencer Oliver Stone a dirigir uma continuação, ainda que mais de 20 anos depois do original?
4 -O Grande Truque - Robert Angier
"Se alguém realmente acreditasse nas coisas que eu faço no palco, eles não iriam aplaudir, eles iriam gritar."
Ainda que eu não possa classificar Angier como um vilão clássico, ele se utiliza de métodos escusos, deixa sua obsessão controlá-lo, dá pouca importância a vida das duas mulheres que se apaixonou e comete (várias vezes) o mais absurdo tipo de assassinato que eu já vi em um filme. Ainda sim, acreditem, o personagem é tão carismático que eu tenho dúvidas em classificá-lo como vilão. Um pouco antes de final quando ele tinha aparentemente vencido e estava confortavelmente em uma posição privilegiada eu estava feliz e contente que o filme iria acabar assim. Infelizmente, eu não havia percebido que o filme ainda teria uma brusca reviravolta e Angier sairia derrotado do filme.
3- Fogo Contra Fogo - Neil McCauley
"Eu sou o dobro do pior problema que você já imaginou"
Ainda que a interpretação de Pacino seja mais intensa e cause um impacto maior do que a performance acertadamente contida de DeNiro, eu sempre acabo torcendo por DeNiro no filme. A cena em que ele recita seu lema para o Pacino "Nunca se deixe apegar a algo que você não possa largar em 30 segundos se você ver a polícia se aproximando", e quando mais tarde ele é obrigado a provar essas cenas sempre me causam um impacto e eu acabo torcendo que ele mate o Al Pacino.
2-Cães de Aluguel - Mister Blonde
"Você vai latir o dia todo como um cachorrinho, ou vai morder?"
Mister Blonde é um personagem subestimado, ele é a alma do filme e o irmão de Vincet Vega de Pulp Fiction, todas as suas frases são legais e ele dá a sensação de perigo a um filme que tem mais da metade do seu tempo passado em um galpão solitário. Eu acho que o que é injusto com a morte de Mister Blonde é que ela é recebida com algum alívio pelo espectador já que ele estava prestes a colocar fogo em um policial e isso faz com que a ausência dele não seja algo que se sente de imediato.
1- Bill, The Butcher - Gangues de Nova York
"Eu tenho quarenta e sete. Quarenta e sete anos de idade. Sabe como eu consegui viver tanto tempo? Medo. O espetáculo de atos que amedrontam. Um homem rouba de mim, eu corto fora suas mãos. Se ele me ofende eu corto fora sua lingua. Ele me confronta, eu corto fora a sua cabeça, enfio em uma lança e penduro tão alto que todos nas ruas possam ver. Isso é o que preserva a ordem das coisas. Medo."
Daniel Day-Lewis está tão bom no papel que eu quase não preciso explicar a minha predileção pelo personagem. Como se isso não bastasse o seu antogonista é Leonardo DiCaprio, em seu último filme antes de virar um ator de verdade. O personagem tem tudo para que eu goste dele, é anti-católico, baseado em uma figura real e Day-Lews foi indicado ao Oscar de melhor ator com o personagem, em outras palavras, Bill, The Butcher é o cara e não merecia ter morrido ainda mais para um personagem tão boboca quanto Amsterdam Vallon.
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