A vida artística de um cantor dentro do
universo da música é, por vezes, tão intensa que não cabe numa única obra. No
filme brasileiro Cazuza, mesmo sendo uma ótima adaptação de sua vida artística,
ela não explorava, por exemplo, a relação intensa que ele tinha com o cantor
Ney Matogrosso. Mas embora o fã mais fervoroso possa reclamar, Bohemian
Rhapsody é ótima adaptação sobre o auge, decadência e redenção de uma das
maiores bandas de rock da história da música.
Dirigido por Brian
Singer (da cine série X-Men), o filme acompanha o nascimento da banda Queen
surgida em 1970, formada por Freddie Mercury (Rami Malek, da série Mr. Robot),
Brian May (Gwilym Lee), Bem Hardy (Roger Taylor) e John Deacon (Joseph
Mazzello). Com a realização de grandes sucessos da música, a trupe vai
conquistando todas as paradas. Porém, do auge vem à decadência e Freddie
Mercury sente na pele o preço em obter a grande fama.
Assim como ocorreu em
X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, Brian Singer tem a proeza de fazer uma bela
reconstituição de época dos anos 70, onde surgiu a banda e sintetizando todo
aquele ar rebelde, paz amor e cores quentes que moldavam aqueles anos. Em
contrapartida, é notório sobre o que é visto na tela, principalmente para os
fãs com olhar mais atento, de que os roteiristas optaram em condensar inúmeras
passagens sobre os primeiros passos da banda e pincelando elas de uma forma
mais cinematograficamente falando. Portanto, para aqueles que esperam em ver
nos cinemas as inúmeras lendas urbanas que a trupe foi colecionando ao longo do
sucesso, podem muito bem acabar se decepcionando, mas isso não impede que os
fãs e marinheiros de primeira viagem se emocionem na frente da tela,
principalmente com as principais músicas de sucesso da banda que disparam aos
nossos ouvidos e que moldam a história como um todo.
É aí que mora o
verdadeiro coração da obra, já que ela explora as origens dos principais
sucessos da banda Queen, como Bohemian Rhapsody, Radio Gaga Ga, Hammer To Fall
e We Are The Champions, Crazy Little Thing Called Love e We Wiil Rock You. Não
deixa de ser divertido, por exemplo, ao vermos os integrantes sendo
perfeccionistas e cuidadosos com a realização de suas principais músicas e que
moldariam as suas carreiras. Vale destacar que isso, logicamente, muito se deve
a Freedie Mercury, que aqui é vivido com intensidade por Rami Malek.
Conhecido pela série
Mr. Robot, Malek incorpora Mercury de uma forma assombrosa, onde ele imita
todos os trejeitos e a energia furiosa que o artista tinha em cima do palco.
Além disso, ele se sai bem ao retratar as principais passagens do cantor em sua
vida pessoal, desde os altos e baixos com a sua esposa Mary Austin (Lucy
Boynton), como também das suas inúmeras relações amorosas secretas. É aí que o
filme derrapa um pouco na falta de ousadia, já que Mercury era bissexual
assumido e no filme essas relações ficaram um tanto que tímidas, mas também não
escondendo a sua verdadeira essência de sua pessoa.
Do segundo ao
terceiro ato final, o filme explora o auge e o declínio da banda,
principalmente pelo fato do sucesso ter subido a cabeça de Freedie Mercury. É
aí que adentramos ao clima meio que sombrio dos anos 80, onde Mercury procura o
seu lugar ao sol, mesmo tendo tudo em sua mão. O cinéfilo, claro, já conhece
todos os ingredientes que moldam uma biografia de um artista e já tendo, então,
uma ideia do que irá vir a seguir, independente da pessoa ter sido ou não fã da
banda na época.
A grande queda de
Mercury ocorre quando ele descobre que contraiu a AIDS, numa época em que a
doença tinha o seu maior grau de perigo e os médicos pouco sabiam como lidar
com ela. É aí que os realizadores optam por liberdades poéticas para moldar
esse momento tão delicado do cantor e retratando ele como alguém a procura de
sua redenção. Embora apelativo para esse momento, não deixa de ser emocionante
quando a música Who Wants To Live Forever é ouvida num momento tão delicado do
protagonista.
Após o declínio, o
ressurgimento da banda é todo pincelado para que os minutos finais do filme se
tornem um grande espetáculo. É preciso ter coração de pedra para não se
emocionar com a reconstituição do grande show Live Aid ocorrido em 13 de Julho
de 1985. De uma forma primorosa, Brian Singer elabora um plano sequência, para
termos uma total plenitude do mar de pessoas que se encontrava naquele estádio
e sermos jogados no palco onde a banda se apresentou.
A partir daí, são
quinze minutos de luz, som e energia vinda dos interpretes que encarnaram de
corpo e alma a banda do começo ao fim. É um momento que nos damos conta que
Queen nasceu como uma banda para se tornar a voz dos excluídos da sociedade,
que clamam por músicas que soem como hino de protestos contra aqueles que se
dizem poderosos. Em tempos em que o conservadorismo se espalha pelo mundo, uma
banda como Queen faz falta em todos os sentidos.
Embora não sendo perfeito em
alguns momentos, Bohemian Rhapsody é uma surpreendente experiência
cinematograficamente sensorial e que nos ajuda a lavar a alma em tempos de
dúvidas, medos e incertezas.
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