Sempre quando eu vou participar dos cursos de cinema do Cine Um, por
exemplo, há sempre alguns vídeos interessantes para serem vistos na tela antes
da atividade. Em um desses há um curioso, onde mostra o primeiro plano de
determinados filmes clássicos e de como eles se casam com o seu plano final. Em
Animais Noturnos, as primeiras cenas são impactantes, das quais nos deixa
desconfortáveis, mas que ao mesmo tempo, tem tudo a ver com os momentos finais
da obra e isso já é um grande feito.
Dirigido por Tom Ford (Direito de Amar) o filme é baseado no livro Tony and Susan, de Austin Wright e
que conta a história de Susan (Amy Adams), mulher bem sucedida na vida, mas que
vive melancólica com o seu casamento desastroso. Certo dia ela recebe um livro
do seu ex-marido (Jake Gyllenhaal) do qual começa a ler. Imediatamente a trama
se direciona justamente dentro da trama do livro, onde acompanhamos um pai de
família (também interpretado por Jake Gyllenhaal), cujas férias terminam de
forma violenta e o caso acaba sendo investigado por um policial (Michael
Shannon).
Conhecido pelo universo da moda, Tom Ford surpreende ao demonstrar
total segurança na direção e ao mesmo tempo dando verdadeira aula de como se
cria um cinema autoral. Se no direito de Amar ele já havia começado bem, aqui
ele se comporta na cadeira de cineasta como um verdadeiro veterano e nos
brindando com um filme tenso, sombrio e cheio de significados. A trama dentro
da trama pode até não ser novidade no cinema, mas ao mesmo tempo, ela serve
como uma espécie de representação dos atos e consequências dos personagens
principais em cena e que os levam a um caminho sem volta.
Diferente do que se imagina, a trama mostrada dentro do livro acaba se
tornando o foco principal, pois é nela que se encontra todo o momento dos quais
farão o cinéfilo se grudar na cadeira e se perguntar o que virá em seguida. Na
realidade, a trama do livro dentro da história, pode ser interpretada como uma
forma da qual um determinado personagem da trama procurou saber expressar os
seus sentimentos devido a um passado que lhe deixou em pedaços. E se num
primeiro momento a trama dentro da trama não faz sentido, o roteiro se
encarrega de amarrar as pontas soltas e fazer com que o ato final termine de
uma forma esclarecedora e imprevisível.
Além de uma trilha, montagem e fotografia que remetem um belo filme
policial de antigamente, Tom Ford foi feliz ao escolher o seu elenco, do qual
cada um dá um verdadeiro show em cena. Se Emy Adams já havia surpreendido no
recente A Chegada, aqui ela passa uma personagem com conflitos internos e que
não sabe qual o caminho trilhar depois de ter escolhido caminhos errôneos pela
vida. E se Jake Gyllenhaal novamente nos
brinda com uma interpretação eficaz, ouso dizer que Michael Shannon nos
apresenta aqui o melhor desempenho de sua carreira, pois ele simplesmente rouba
a cena toda vez que surge com o seu trágico personagem e que acaba se tornando
o mais fascinante de toda a trama.
Resumidamente, Animais Noturnos é um filme de escolhas e de suas
consequências. Ao retratar o pior do ser
humano do mundo contemporâneo, ele acaba escancarando um mundo cada vez
mais moldado pela hipocrisia, atos
inconsequentes e por um conservadorismo pálido perante as mudanças que sempre
ocorrem no dia a dia da sociedade. Uma vez que cada um dos personagens comete
um ato imprevisível, ao mesmo tempo escolheram uma rota de colisão do qual
gerará cicatrizes permanentes e que, talvez, a palavra perdão não seja o
suficiente.
Com um
final em aberto em bem anti-hollywoodiano, Animais Noturnos é um belo e
poderosíssimo filme, do qual fará as pessoas pensarem e ao mesmo tempo se
perguntarem sobre o destino de cada um dos seus personagens que se encontram
perdidos em suas próprias vidas.
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