20 de dezembro de 2016

Sully - O Herói do Rio Hudson



Às vezes o mundo real é mais surpreendente do que qualquer ficção. Seja ela em maior ou menor grau, existem histórias das quais que, mesmo havendo provas, duvidamos até mesmo de sua veracidade. É pensando desta forma que, talvez, Clint Eastwood tenha se interessado em levar os eventos do dia 15 de Janeiro de 2009 para as telas, já que a situação fez com que os EUA e o mundo parassem na frente da TV, pois tudo era deveras surpreendente.
Baseado em fatos verídicos, acompanhamos o piloto Sully Sullenberger (Tom Hanks), que vive uma fase de herói nacional, já que conseguiu o que muitos pilotos na história nem sonhavam em conseguir. Durante uma viagem de vôo, seu avião é atingido por um grupo de pássaros e fazendo com que um dos motores da aeronave ficasse comprometido. Sem muita opção em pouco espaço de tempo, Sully toma uma medida arriscada: pousar o avião com 155 passageiros a bordo e justamente nas águas do Rio Hudson.
Após o feito, passageiros e tripulantes são resgatados todos com vida e tanto Sully, como o seu companheiro co-piloto (Aaron Eckhart) são reconhecidos como heróis. Contudo, Sully começa a ter conflitos internos com relação a sua façanha, pois sabe que a sua escolha poderia também desencadear um trágico evento. Ao mesmo tempo, os donos da empresa de aviação acreditam que Sully pode ter cometido um erro e o que faz dele um alvo a ser questionado.
Sem muitas pretensões, Clint Eastwood não faz da figura de Sully um herói da pátria, mas sim o retrata na tela como uma pessoa comum, do qual participou de uma situação incomum e que agiu com profissionalismo para o bem dos passageiros dos quais ele levava. Não há também no filme a pretensão em transformar as figuras daqueles que acusam Sully em vilões, mas sim retratar homens que são presos pela burocracia e que, assim como o protagonista, são também seres humanos cheios de dúvidas. Portanto não há heróis ou vilões na trama, mas sim humanos que tentam saber administrar uma situação poucas vezes vista e sentida.
Embora o incidente tenha acontecido em pouco espaço de tempo, podemos facilmente colocá-lo dentro do gênero “filme catástrofe”, pois Eastwood consegue explorar alguns dos passageiros do avião através de flashback. É claro que isso é um artifício para fazer com que nos identifiquemos com algum dos personagens apresentados, mas meio que ele soa um tanto que deslocado, pois pelo que é entendido, estamos vendo um flashback de Sully, mas se é assim como ele poderia ter acompanhado o que os passageiros estavam fazendo minutos antes de embarcarem? Um momento de pouca verossimilhança e que somente serve para dar mais dramaticidade à trama, mesmo que de uma forma um tanto que equivocada.
O filme funciona mais graças à presença do sempre competente de Tom Hanks e que, apesar de não possuir uma caracterização semelhante com o verdadeiro Sully Sullenberger mostrada no filme, sua interpretação é eficaz. É genial, por exemplo, quando o seu personagem encara dentro de si as inúmeras possibilidades das quais poderiam ter surgido e que causariam um verdadeiro desastre. É nessas cenas que Hanks passa todo o seu potencial, mesmo numa trama da qual não exija muito dele.
Vale destacar o ato final da trama, pois é colocado em pratica o lado humano perante uma situação da qual nem a própria tecnologia pode realmente explicar.  Se a tecnologia diz o que é para se fazer, não significa que colocá-la em prática numa situação crítica irá dar realmente certo. O milagre do Rio Hudson talvez tenha acontecido até mesmo por inúmeros fatores, mesmo em poucos segundos e que tudo poderia ter dado errado. 
Sem nenhum pingo de pretensão, Sully - O Herói do Rio Hudson é apenas uma pequena reconstituição de um grande feito alcançado pelo profissionalismo e pelo desejo de salvar inúmeras vidas a bordo.  
 

17 de dezembro de 2016

ROGUE ONE – UMA HISTÓRIA STAR WARS

Quando de Star Wars: Episódio IV - Uma Nova Esperança foi lançado no final da década de 70, os EUA viviam em tempos nebulosos: derrota no Vietnam, crise econômica, escândalo de Watergate, racismo, intolerância e aumento da criminalidade em grandes cidades como Nova York. O filme veio para dar uma levantada na moral, onde o povo assistia um grupo de rebeldes contra um grande império, do qual trazia somente perseguições e mortes para inúmeras pessoas em toda a galáxia. Depois de duas trilogias, e mais o começo de uma  iniciada com O Despertar da Força no ano passado, chega a vez de  Rogue One - Uma História Star Wars, do qual trás novamente idéias já exploradas do filme de 1977, mas que de uma forma surpreendente, corresponde com diversos assuntos atuais, principalmente com relação ao fascismo que está cada vez aumentando, tanto nos EUA, como também no Brasil e no mundo.
Dirigido por Gareth Edwards (Jurassic World) o filme acompanha a história de Jyn Erso (Felicity Jones), que vê sua mãe sendo morta na sua frente e seu pai Galen (Mads Mikkelsen) sendo levado pelo império galáctico e sendo forçado a construir uma incrível arma de destruição, ou seja, a Estrela da Morte. Anos se passam e Erso se torna uma rebelde fora da lei, mas logo é resgatada (a contra gosto) pela aliança rebelde, que lhe dá a missão de chegar até o guerrilheiro Saw Gerrera (Whitaker), que aparentemente recebeu uma mensagem secreta enviada por Galen através do piloto Bhodi Rook (Ahmed). A partir daí, a relutante heroína ganha à companhia do rebelde Cassian Andor (Luna), do monge-guerreiro Chirrut Îmwe (Yen) e seu companheiro Baze Malbus (Wen) e do droide K-2SO (Tudyk), que foi reprogramado para ajudar aqueles que se opõem ao Império.
Embora a trama esteja inserida em uma saga vasta, cujo seu universo já se espalhou tanto por games, séries, gibis e livros, Rogue One é uma história que possui começo, meio, fim e não faz com que você se veja obrigado a ter que assistir a outros filmes para entender a trama. Aliás, embora com toda a sua riqueza de informações, a trama é aparentemente simples, mas ao mesmo tempo madura e que explora situações até então inéditas dentro da franquia. É como se você revisitasse uma velha casa conhecida, mas nunca havia percebido alguns detalhes nela, dos quais poderiam ter sido mais bem explorados.
É claro que sempre havia um temor em se criar uma trama isolada e sem a participação dos personagens principais da franquia. Porém, havia sempre aquela curiosidade em explorar situações das quais haviam apenas sido citadas anteriormente, como no caso das missões de outros rebeldes contra o império. Felizmente os roteiristas foram habilidosos ao criarem uma galeria de personagens onde cada um possui uma personalidade distinta e que foram muito bem exploradas.
Mas, embora com inúmeros personagens interessantes, a alma do filme se encontra mesmo na personagem Jyn Erso, cuja sua personalidade forte, faz então com que ela se torne relutante perante a situação da qual ela se meteu. Mesmo com a possibilidade de reencontrar com o seu pai, a sua rebeldia em não se meter na causa se torna um dos grandes charmes da trama, pois ela aos poucos vai mudando, conforme vai testemunhando os horrores que o império criou a sua volta. Claro que muito dessa complexidade da personagem se deve muito ao empenho da atriz Felicity Jones, cujo ápice da sua interpretação é quando ela dá de encontro com a imagem de uma gravação do seu pai e faz com que sua personagem revele outra faceta de sua pessoa até então escondida dentro dela.
Dos demais personagens, se por um lado Cassian Andor (Diego Luna) é um personagem apenas “ok” com relação a sua conduta em favor da causa, o droide K-2SO  acaba sendo um pequeno, porém, eficaz alivio cômico durante a trama graças ao seu humor sarcástico. O mesmo não se pode dizer do rebelde Bhodi Rook (Ahmed), cujo seus poucos momentos em cena não fazem com que tenhamos simpatia por ele o suficiente.
Do restante do grupo, acabamos realmente nos importando mesmo com a dupla formada pelo monge-guerreiro Chirrut Îmwe (Yen) e seu companheiro Baze Malbus (Wen), cuja suas teorias com relação à Força trazem a tona uma discussão sobre fé e descrença em meio ao caos. Aliás, Chirrut Îmwe é um personagem que os fãs da franquia irão guardar na memória com muito carinho, pois embora não seja um jedi, sua fé faz com que tome decisões imprevisíveis e emocionantes no decorrer da trama. Fé, aliás, era algo que quase não foi muito explorado durante a franquia, sendo que o único vislumbre disso era através das palavras do mestre Yoda lá atrás no Império Contra Ataca. 
Falando em personagens clássicos, alguns deles surgem no decorrer da história, mesmo que de forma rápida. Se por um lado RD2 e C3PO aparecem em poucos segundos, temos uma surpreendente participação de Darth Vader em duas cenas chaves que, aliás, a segunda é genuinamente assustadora e imprevisível. E como se bastasse isso, os efeitos visuais tiveram papel fundamental para recriar a presença do ator Peter Cushing através de um dublê e trazer de volta em cena o maléfico Governador Tarkin que havia aparecido pela primeira vez em Uma Nova Esperança. 
Falando em efeitos visuais, alguns que forem assistir podem até dizer que a presença deles é discreta aqui, mas isso colaborou para não desvirtuar o lado retro que o filme possui e que se encaixa com o visual visto na trilogia original. Porém, toda ação e parte técnica dos efeitos se concentraram mais no grande ato final, onde os rebeldes liderados Jyn Erso tentam dar a última cartada contra o império para então roubar os planos com relação à Estrela da Morte. Aqui, o cineasta Gareth Edwards consegue a proeza de injetar um grau de verossimilhança poucas vezes visto na franquia e fazendo a batalha, tanto no espaço como na superfície se tornarem cruas, violentas e realistas.
Claro que para a maioria dos fãs que tem no mínimo algum conhecimento da história da franquia, pode até tirar uma base de como a trama termina, mas para a maioria do público ela poderá até mesmo soar trágica e imprevisível. Não tinha como ser diferente, mas ao mesmo tempo é uma prova de como os seus realizadores foram corajosos em sua proposta e dando um exemplo de como a saga pode sim ainda criar histórias originais e que das quais nos emocionem. Se até então o universo expandido de Star Wars era para mim algo descartado, aqui ele me provou que, se for bem conduzido, pode ser sim bem apreciado.
Com um final que termina exatamente aonde começa Episódio IV: Uma Nova Esperança, Rogue One - Uma História Star Wars acerta em cheio ao se corresponder com a nossa realidade atual, da qual se encontra cada vez mais se afundando num fascismo de proporções mundiais, mas nos passando a lição de que nunca é tarde para redescobrirmos a esperança que há dentro de todos nós. 


7 de dezembro de 2016

A CHEGADA

A comunicação de hoje pode ser feita de inúmeras formas, pois basta, por exemplo, usar o tradutor do Google para saber o que a outra pessoa do outro lado do mundo está falando. Temos tanto recursos para termos um bom diálogo, mas que, infelizmente, cada vez mais estamos nos perdendo em meio à ganância, paranoia e preconceito. No mais novo filme de Denis Villeneuve (Incêndios), a trama explora a idéia de que, a comunicação pacífica global, é sim a melhor arma contra possíveis guerras que podem até mesmo dizimar toda a humanidade.
Baseada no romance “Story of Your Life”, publicado por Ted Chiang em 1998, acompanhamos a missão da Doutora em linguística Louise Banks (Amy Adams), que foi recrutada pelo governo dos EUA em tentar dialogar com seres extraterrestres que pousaram na terra. Na realidade há doze espaçonaves (em forma parecida com a de um ovo) pousadas em áreas distintas pelo globo e onde cada governo tanta compreender os motivos deles estarem ali. Não demora muito tempo para que a doutora lute contra o relógio, pois inúmeras potências começam a pensar em atacar.
A premissa pode até parecer simples, mas nada caindo nas mãos de Villeneuve se torna algo previsível, mas sim reflexível. Ao começar pelo fato de a todo o momento a doutora Banks ter lembranças (?) de quando era mãe solteira e se confrontado com um delicado problema vindo de sua filha. Essas passagens servem para que ela tente desvendar a melhor forma de comunicação perante os alienígenas, mas até onde isso é realmente verdade?
É aí que Villeneuve nos testa, já que essas passagens vêm e voltam na trama, para então montarmos um quebra cabeça que se encontra bem na nossa frente. Aliás, esses momentos me fizeram me lembrar de A Árvore da Vida de Terrence Malick, aonde a trama vinha e voltava no tempo e suas imagens pareciam de alguém observando a todo o momento. Ambos os casos tratam sobre a vida humana, sendo que aqui ela é posta em cheque inúmeras vezes, principalmente pelo fato dos seres humanos serem às vezes movidos por suas escolhas e terem que enfrentar as suas consequências.
Falando em atos e consequências, Banks se torna uma espécie de parede que separa os alienígenas dos seres humanos, já que esses últimos são movidos pelo desejo de escolha de somente se defender, mas não especificamente se comunicar. É então que testemunhamos a doutora, ao lado do seu parceiro de ciências Ian Donnelly (Jeremy Renner), usarem a comunicação através de palavras escritas, para logo descobrir a forma que os alienígenas se comunicam, não com palavras, mas sim com figuras enigmáticas. Não há como negar que é nesses momentos que o filme remete a filmes clássicos da ficção como 2001, Contatos Imediatos de 3º Grau e Contato, mas de uma forma da qual soa sempre original.
Embora existam inúmeras informações para ser digerido ao longo da trama, o roteirista foi cuidadoso para que essas passagens nunca soassem confusas, mas sim que fizesse com que ficássemos curiosos com cada imagem vista na tela. Isso melhora ainda mais pelo fato de já estarmos envolvidos com os seus personagens, principalmente pela sua protagonista. Amy Adams novamente nos brinda com um papel sob medida, mas que ao logo do tempo, nos surpreende ao conseguir nos passar todas as emoções da qual a sua personagem sente, principalmente quando ela encara determinadas revelações surpreendentes.
“Surpreende” talvez seja a palavra correta que define os momentos finais da trama, principalmente da maneira que nos é apresentado a melhor solução contra uma possível guerra iminente. Como eu disse no começo do texto, a comunicação é a melhor arma contra um futuro opressor que, embora aqui seja usada ao pé da letra, ela se torna mais do que válida, principalmente em tempos em que cada vez mais a extrema direita anda dominando ao redor do mundo e sem ter interesse em um dialogo pacifico. Pode ser um filme de ficção, mas uma proposta como essa, principalmente nos dias de hoje, sempre será bem vinda.
E como se já não bastasse tudo isso, os últimos minutos acabam nos emocionando pelo fato de nos colocar de frente com uma pergunta de peso: “se você tivesse conhecimento de sua vida, do começo ao fim dela, mudaria alguma coisa?”.
Denis Villeneuve nos faz levar essa pergunta para fora do cinema e ficamos então pensando sobre as inúmeras passagens de nossa vida e de como cada momento serviu para nos tornamos o que nós somos hoje. Talvez não tenha como mudar o que já aconteceu ou que acontecerá, mas o que conta é como você irá usar isso ao seu favor. Nada melhor, portanto, usar toda essa informação e experimentá-la em sua total plenitude. 
A Chegada pode até não ser um dos melhores filmes do ano, mas fazer a gente pensar sobre nós mesmos já é um grande feito. 

23 de novembro de 2016

Animais Fantásticos e Onde Habitam


Sete livros que deram origem a oito filmes de grande sucesso de público e crítica. Ao término das aventuras de Harry Potter no cinema, muitos ficaram órfãos, pois não puderam mais viajar para aquele mundo mágico, onde a fantasia e realidade ficavam separadas em apenas meros detalhes. Mas como o mundo de J.K Rowling é vasto, não fiquei surpreso ao anunciarem Animais Fantásticos e Onde Habitam como uma nova franquia da qual se explorasse mais daquele mundo cheio de conteúdo.

Com roteiro da própria escritora J.K Rowling, a trama se passa no ano de 1926 em Nova York, onde vemos o jovem bruxo Newt Scamander (Eddie Redmayne) desembarcar na cidade para ajudar determinados animais dos quais ele carrega em sua maleta. Durante a sua chegada, ele acaba acidentalmente trocando a sua maleta por um humano chamado Jacob Kowalski (Dan Fogler) e fazendo com que alguns de seus animais acabassem se soltando. Além de ter que recuperá-los, Scamander enfrenta tanto resistência de regras impostas pela comunidade de bruxos da cidade, como também de forças malignas e misteriosas que colocam o local em perigo.

Responsável pelos títulos dos quais se explorou o amadurecimento de Harry Potter nas últimas aventuras para o cinema, David Yates retorna à cadeira de cineasta para comandar esse mundo mágico já tão familiarizado e que novamente consegue com certo êxito. Vale destacar o fato do filme não exigir da pessoa de primeira viagem a ter que ver todos os filmes anteriores, já que a trama se passa no passado e bem desprendido de tudo do que já foi visto. Sendo assim, nos é apresentado uma trama fresca, do qual se explora não somente a magia, como também outros temas, que vai desde a proteção aos animais, como também assuntos espinhosos com relação à igreja e o bullying.

Falando nisso, é preciso salientar que, embora a franquia tenha nascido para atrair pessoas de todas as idades (principalmente os pequenos), esse primeiro filme possui dois tons distintos, dois quais fica oscilando do começo ao fim do filme. Se os primeiros filmes do jovem bruxo eram leves e coloridos, aqui isso também há, mas dando espaço para momentos sombrios e até mesmo assustadores. Isso causa uma sensação de estranheza, como se por um momento estivéssemos vendo dois filmes diferentes em um, mas nada que prejudique muito o resultado final da experiência.

Em termos de efeitos visuais, novamente eles dão um verdadeiro show. Aqui, por exemplo, não há regras a limites de espaço com relação a salas ou objetos, já que todos possuem um espaço vasto: a sequência onde mostra a real natureza da maleta do protagonista, onde se encontra todos os seus animais, é uma das melhores partes do filme.

Mas é claro que nada disso funcionaria se não houvesse personagens cativantes, sendo que aqui há, pelo menos em parte. Diferente de Harry Potter, conhecemos Newt Scamander já como adulto, carregando consigo inúmeras histórias ainda misteriosas e que poderá ser futuramente exploradas. Embora já tenha provado o seu grande talento em filmes como Teoria de Tudo e Garota Dinamarquesa, Eddie Redmayne me passa a ligeira sensação de que não consegue se desvencilhar dos seus personagens anteriores, já que seus cacoetes e trejeitos remetem a eles. Se isso não ajuda, pelo menos não atrapalha na sua interpretação como Newt Scamander, já que ele nos passa um personagem que oscila entre timidez com excentricidade e se livrando de qualquer comparação com o jovem bruxo Potter.

Mas quem acaba realmente se destacando na trama é justamente um trouxa (ou 'não-maj', como se fala na Nova York) Jacob Kowalski, interpretado de uma forma leve e emocional por Dan Fogler. Fazendo o típico personagem que está no lugar errado e na hora errada, Jacob foi criado para o filme como uma espécie de representação de nós, meros mortais, perante as situações extraordinárias, mas que ao mesmo tempo consegue manter certa lucidez perante a tudo que vê. Alguns dos momentos tanto de humor, como também os emocionais, são justamente protagonizados por ele e os minutos finais da trama selam o seu destino dentro dela de uma forma muito bela e poética.

Claro que nem tudo são flores com relação a personagens. Porpentina Goldstein (Katherine Waterston) meio que se perde em alguns momentos na trama, mas ganha nivelação graças à presença de sua irmã Queenie Goldstein (Alison Sudol). E, se o veterano Jon Voight é jogado na produção para interpretar um personagem dispensável, sua situação acaba não sendo pior se comparada a de Colin Farrell, cuja sua interpretação engessada acaba prejudicando na construção do personagem Percival Graves. Pelo menos, tanto o personagem como intérprete, dão lugar a uma revelação bombástica e que terá consequências nas próximas aventuras no cinema. 

Entre acertos e erros, Animais Fantásticos e Onde Habitam começa muito bem e abrindo inúmeras possibilidades futuras para o universo de fantasia criado J.K Rowling para o cinema.



9 de novembro de 2016

DOUTOR ESTRANHO

Quando a Marvel decidiu levar por conta própria os seus personagens para o cinema, havia sempre uma preocupação de não extrapolar, mas sim pensando em convidar o cinéfilo de primeira viagem para conhecer aquele universo de forma gradual e sem complicação. Quando o primeiro Homem De Ferro foi lançado, foi inserido um grau de verossimilhança, para que então, o cinéfilo acreditasse que um multimilionário poderia realmente criar uma super armadura. Quando a mitologia foi inserida através do lançamento de Thor, coube a ciência e magia transitar de uma forma convincente e que fosse dar continuidade com a proposta “pé no chão” iniciada pelo estúdio.
Depois de quase dez anos, e com bons filmes no currículo, chegou à hora do estúdio abraçar sem medo um pouco mais do gênero fantástico, onde a magia e os mistérios do universo possam ser ainda mais explorados. Se em Guardiões Das Galáxias se provou que era possível serem exibidos nos cinemas novos mundos, além dos seus inúmeros seres diversificados, explorar outros cantos desse universo desconhecido seria então uma questão de tempo. Eis que finalmente chega as telas Doutor Estranho, uma divertida e incrível experiência visual, que pode até mesmo ser comparada ao enigmático final do clássico 2001 Uma odisséia no espaço.
Dirigido por Scott Derrickson (O Exorcismo de Emily Rose), conhecemos aqui o arrogante neurocirurgião Stephen Strange, que embora seja um especialista na área de salvar vidas, não esconde o fato de possuir um ego que o faz se tornar uma pessoa desprezível. Porém, quando sofre um grave acidente e que deixa as suas mãos inutilizadas, ele tem então que começar do zero e começar agir como um homem comum em busca de um novo começo. Quando vai ao Himalaia para buscar uma espécie de cura milagrosa, mal sabe ele o tipo de porta que acabou abrindo para si e para o seu próprio espírito.
Uma vez apresentado o personagem, tudo que vem depois soa convincente e acabamos por então comprando a proposta da magia com facilidade, principalmente pelo fato de sempre haver uma explicação sobre o que está acontecendo na tela, mas nunca de uma forma exagerada ou que faça a gente cansar. Nessa primeira meia hora de projeção, nós presenciamos a mudança de caráter do protagonista, pois tudo que ele acreditava era apenas uma parte fina da superfície desse universo vasto e cheio de conteúdo. Mas claro que a atuação sempre ajuda para facilitar o que assistimos e Benedict Cumberbatch (Jogo da Imitação) cumpre muito bem esse propósito.
Com uma atuação que jamais soa exagerada, Cumberbatch encarna Stephen Strange como se já tivesse interpretado o personagem inúmeras vezes e ao mesmo tempo nos passando um ar de veterano com relação a tudo que já viveu com relação à ciência. Portanto, no momento quando ele encara o fato de quão esse mundo que ele vivia era limitado, á sua atuação soa por então convincente, assim como também a sua mudança de caráter e fazendo do personagem alguém bem mais agradável. Porém, é preciso também dar crédito a Tilda Swinton (Constantine), pois graças ao seu ar de veterana e ambiguidade que ela insere no seu personagem ancião, faz dela então a melhor interprete em cena e eclipsando até mesmo o protagonista em alguns momentos.
Contudo, não é dessa vez que temos um vilão a altura do protagonista nos filmes da Marvel (a não ser o Loki de Thor) e Mads Mikkelsen (A Caça), por melhor que seja a sua atuação como ator, seu desempenho aqui é contido e jamais soa como uma grande ameaça para ser detida. Pelo menos, a sua presença faz com que as pedras do tabuleiro se locomovam e fazendo com que os personagens saiam do seu habitat natural. É ai então que o filme dá um verdadeiro show de som e imagem poucas vezes visto nesses últimos anos no cinema.
Diferente de outros filmes, onde o 3D é facilmente descartado, aqui ele se torna uma ferramenta indispensável e dando a entender que cada cena filmada foi pensada para ser apresentada nesse formato. Se os primeiros minutos do filme já nos espantam com os giros de câmeras e mudanças no cenário de uma forma tão fantástica, aguarde para ver o herói contra os vilões em meio a uma Nova York que fica de cabeça para baixo literalmente e mudando rapidamente de um segundo para o outro. Se isso soa como algo já visto em filmes como A Origem, acredite, o que faltou lá tem aqui e muito mais do que se possa imaginar.
Mas infelizmente, além de possuir um vilão não muito interessante, o filme também sofre um pouco com as já habituais piadas dos estúdios Marvel. Tudo bem que nunca é demais haver humor em determinados filmes, mas aqui ele surge em momentos errados, como se eles tivessem sido inseridos em última hora e para agradar as massas. Isso piora principalmente quando eles surgem após momentos dramáticos e que empalidece um pouco o bom resultado final do filme.
Mas talvez eu esteja exigindo demais de um filme, cuja proposta é entreter a tudo e a todos, mesmo quando ele tenta desafiar os nossos sentidos. O roteiro possui, inclusive, elementos que faz com que o filme pudesse ter ido muito mais longe do que se imaginava e quando a gente quer mais dessas áreas vastas e desconhecidas do universo seja destrinchado, o filme simplesmente acaba. Caso aconteça uma sequência é para torcermos para que a Marvel perca o seu medo e leve o herói para infinito e além desse cosmo.
Com as suas habituais cenas finais inseridas nos créditos finais, Doutor Estranho é uma divertida e incrível experiência extrassensorial, mas que jamais soa estranho, mas sim prazeroso de ser visto.
 

4 de novembro de 2016

A GAROTA DO TREM



Certa vez o mestre Stanley Kubrick disse que livros medíocres rendem boas adaptações para o cinema, como foi no caso do seu O Iluminado, baseado na obra de Stephen King e do qual ele achava uma péssima leitura. Já no caso do livro O Código Da Vinci que, mesmo possuindo uma curiosa leitura, rendeu uma péssima adaptação do cinema e que se repetiu em suas continuações. Embora eu seja suspeito a dizer, já que eu não li o livro, A Garota do Trem meio que transita nestes dois pensamentos sobre adaptações da literatura para o cinema, mas que felizmente funciona como filme e nos prende atenção até o seu final.
Dirigido por Tate Taylor (Histórias Cruzadas), acompanhamos a trama de Rachel (Emily Blunt), mulher solitária que vive observando os moradores de duas casas da qual ela passa durante a viagem. Certo dia, ela presencia algo diferente, fazendo com que ela embarque numa realidade crua de mistérios e investigação. Ao mesmo tempo, gradualmente, conhecemos um pouco sobre cada um desses personagens que ela observava e revelando á real faceta de cada um deles.
Adianto que a trama principal é das mais previsíveis, sendo que ela poderia ser facilmente encontrada em outros filmes de suspense, principalmente aqueles criados a exaustão durante a década de 90. Porém, se a trama não ajuda pelo menos o cineasta Taylor consegue tirar leite da pedra, pois é impressionante como a sua direção segura consegue fazer com que a gente não saia da cadeira, mesmo quando a gente já tem uma base do real mistério da trama. Isso se deve graças a uma montagem elegante, do qual faz com que a primeira hora da trama seja apresentada de uma forma fragmentada e ascendendo o desejo dentro de nós em querer entender o que está acontecendo nela.
Outro aspecto técnico que ajuda a criar a vida ao filme é a sua trilha sonora, onde cada personagem tem a sua e fazendo com que ela se torne uma parte de sua personalidade distinta. Novamente o mestre Danny Elfman (Edward: Mãos de Tesoura) cria mais um louro de trilha sonora, da qual faz com que soe em nossos ouvidos de forma singela e fazendo com que a levemos para fora do cinema após a sessão. Até hoje me pergunto por que os membros da academia não deram até agora um prêmio pela sua carreira.
Falando em prêmios, dificilmente Emily Blunt (Diabo Veste Prada) não deixará de aparecer nas listas das principais premiações cinematográficas dos próximos meses, já que aqui ela nos brinda com mais uma boa atuação. Mesmo com as limitações da trama, Blunt cria para a sua personagem uma personalidade forte, mesmo quando aparenta um estado mental frágil e que transparece em seu olhar febril. Pode-se dizer que á primeira meia hora com imagens fragmentadas seja então uma representação de seu estado mental e fazendo com que a sua atuação e parte técnica da obra se case muito bem.
Porém, a sua personagem não é a única da ala feminina da qual domina o filme. Tanto Rebecca Ferguson (Missão Impossível 5) como Anna, como também Haley Bennett  (Sete Homens e Um Destino) como Megan, sejam uma espécie de dois lados da mesma moeda, cujo os seus atos e consequências distintas nasceram a partir das atitudes inconsequentes da ala dos homens. Se Anna tenta seguir uma vida normal, mesmo carregando um fardo do qual ela não se orgulha, Megan por sua vez, procura se redimir de erros que cometeu, mas ao mesmo tempo criando novos e adentrando por um caminho sem volta da qual ela tenta fugir.
Ambas as atrizes estão muito bem em cena e fazendo com que o elenco masculino, composto por Justin Theroux, Luke Evans e Édgar Ramírez meio que se percam em cena, fazendo dos seus personagens apenas peças fundamentais da trama, mas que ambos os três não tem muito que acrescentar. Isso por sinal prejudica o resultado final, principalmente para aqueles que até tinham esperança de serem surpreendidos, mas que infelizmente isso não acontece. Os momentos finais da trama meio que se salvam somente graças à entrega das atrizes e fazendo com que a proposta principal da trama, com relação à força do sexo frágil perante o machismo intolerante, soe mais alto.
Mesmo com os seus defeitos, A Garota do Trem é uma prova de boa adaptação da literatura para o cinema, mesmo quando ela nos soa decepcionante em momentos cruciais trama.

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