Hoje vivemos num mundo do qual é vendido nas entrelinhas como mais tolerante, aonde a raça e credo são mais aceitas uns pelos outros. Contudo, aceitação não esconde o que está cada vez mais evidente nos dias de hoje que é à divisão de classes, onde em tempos de crise e eleições políticas, por exemplo, fica cada vez mais explicito a posição de determinadas pessoas que, acreditam serem tolerantes, mas não escondem o rancor contra aqueles que não são do seu mesmo nível deles. Desde o tempo de filmes como Metrópolis (1927) o cinema sempre serviu como uma janela, aonde mostra, mesmo que por metáfora, a realidade crua que vivemos no dia a dia e Expresso do Amanhã é o mais belo exemplo vindo do cinema recente.
Dirigido pelo cultuado diretor coreano Joon-ho Bong (Hospedeiro), acompanhamos o dia a dia do que restou da humanidade após um apocalipse, do qual fez com que a terra entrasse numa nova Era Glacial. O que restou da humanidade agora vive num gigantesco trem que, jamais para, e é dividida entre classes: os afortunados vivem nos primeiros vagões com todas as farturas, enquanto os necessitados vivem em condições precárias e alimentos limitados. Quando a situação se torna insuportável, Curtis (Chris Evans) decide criar uma rebelião, para assim chegar ao primeiro vagão e tomar o controle do trem.
Baseado na HQ francesa Le Transperceneige, de Jean-Marc Rochette e Jacques Loeb, Joon-ho Bong deixa claro que seu filme não é preso somente em um gênero, mas sim diversos, desde ficção, drama, ação e catástrofe. Porém, acima de tudo, a questão de retratar o homem em tentar sobreviver a todo custo, desencadeia a sua real face, dependendo de como cada pessoa irá administrar a situação da qual se encontra e até que ponto esses momentos podem transformar ela. Em meio ao caos, o sistema capitalista governante retratado na trama propõe regras para serem seguidas, mas não enxergando além do que seus olhos podem ver como as consequências que serão vistas mais pra frente.
Isso é exemplificado na presença da personagem Mason (Tilda Swinton), uma espécie de “pau mandado” de Wilford, líder dos poderosos e que comanda o trem. Através de Mason, conhecemos as reais regras daquele universo isolado, da qual se alguma regra for quebrada, e gerando uma possível rebelião, haverá então graves conseqüências. Em sete minutos em que a personagem fala, conhecemos então o lado intolerante dos poderosos, pois eles não se acham carrascos, mas sim justos por ditarem as regras.
Curiosamente no decorrer do filme, nós não somente conheceremos a incompreensão dos poderosos perante a minoria, como também iremos observar a quão essa última não consegue enxergar além de sua própria classe: a cena em que mostram pais procurando os seus filhos numa classe de aula dos poderosos, e não reconhecendo eles por estarem de cabelos cortados e bem vestidos, exemplifica bem isso. Outro fator determinante do filme é que, no final das contas, não há heróis e vilões na trama, mas sim pessoas defendendo o que acreditam, mesmo correndo um sério risco de estarem errados.
Curtis (Evans) acredita que, se conseguir o controle do vagão principal, irá conseguir condições melhores ao seu povo. Porém, Namgoong Minsoo (Kang-ho Song, de Sede de Sangue) é sua contra parte: ele pertence à minoria de Curtis, mas ele não deseja o poder, mas sim uma terceira opção, da qual é de se ver livre daquele mundo limitado e distorcido. Ambos com grandes mentes, mas com pensamentos diferentes, sendo um verdadeiro reflexo de políticos de hoje, que não conseguem enxergar nada além de suas virtudes camufladas.
Isso acaba por também colocar na mesa o lado hipócrita de ambos os lados, pois (assim como o clássico Metrópolis) querendo ou não, uns dependem um dos outros para sobreviverem e manterem a maquina funcionando da qual eles vivem. Tudo é claro poderia ser resolvido, se não fosse o rancor, medo e preconceito falarem mais alto. Com isso, mortes, revelações e fé cega desencadeiam um caminho sem volta, do qual, ao menos, sobra um fio de esperança nos derradeiros minutos finais da trama.
Com presenças ilustres de nomes como John Hurt e Ed Harris, Expresso do Amanhã é uma bela metáfora com relação ao nosso mundo contemporâneo de hoje em que vivemos, aonde testemunhamos o lado hipócrita de determinadas pessoas e que, por mais que elas tentam camuflar, fica cada vez mais explicitas as suas ações.
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