Stanley Kubrick disse uma vez que, se caso houvesse alguém que entendesse o final de 2001: Uma Odisseia no Espaço, ele então se sentiria um fracassado, pois a sua obra ser compreendida não era o seu objetivo. Baseado na obra Arthur C. Clarke, o filme de 1968 ainda hoje desperta interesse e levanta inúmeras teorias, principalmente com relação ao seu enigmático ato final. Fã incondicional da obra, Christopher Nolan, sempre desejou fazer algo parecido no cinema e eis que ele lança seu Interestelar, que diferente da obra de Kubrick; aqui há sempre uma preocupação em tentar explicar o que está acontecendo para o cinéfilo que assiste e isso acaba sendo o seu maior calcanhar de Aquiles.
Não que isso vá prejudicar o filme como um todo, pois o seu desenvolvimento, imagens, trilha e acima de tudo o lado humano dos personagens é o que faz da obra ser indispensável. Em um futuro não muito distante, o engenheiro espacial Cooper (Matthew McConaughey) trabalha como fazendeiro cultivando milho para alimentar a população mundial. A maioria dos alimentos da Terra já acabou e as plantações que restam são constantemente atacadas por pestes e tempestades de poeira. Ao lado dos filhos e do sogro (vivido pelo ótimo John Lithgow), ele vive de maneira simples, mas se incomoda com o fato da humanidade ter se contentado em sobreviver e esquecido seu lado empreendedor.
A primeira parte do filme busca fazer gradualmente uma construção crível com relação aos personagens, para que então o cinéfilo se identifique com eles facilmente e aceitar a mirabolante trama, que é sobre salvar a humanidade. O protagonista é chamado para liderar uma missão espacial, que busca explorar novos planetas que podem substituir a Terra. Assim falando pode parecer fácil, mas o filme se adentra há inúmeras teorias de espaço tempo, valorizando muito as questões levantadas por Albert Einstein, que muitos cientistas de hoje aprovam.
Do início ao fim, se percebe como Christopher Nolan tem um vício inabalável sobre querer a qualquer custo dosar inúmeros momentos de verossimilhança na trama e fazer com que gente acredite naquele não muito distante futuro. Bons exemplos estão no primeiro ato, em que, mostra em curtos depoimentos em vídeo, pessoas falando do seu dia a dia difícil. As cenas em que mostram ruas e casas empoeiradas e plantações morrendo devido a uma misteriosa peste dão um ar de apreensão, pois não foge muito da realidade de alguns países de hoje que sofrem com as mudanças climáticas.
E, se por terra a situação é bem realista, pelo espaço a situação não é muito diferente. Assim como o recente Gravidade, Nolan consegue a proeza de jamais exagerar nos efeitos visuais, mas sim faz com que eles se tornem importantes para o desenvolvimento de uma melhor trama. O mesmo se pode dizer da fotografia de Hoyte Van Hoytema, que consegue ser deslumbrante por quase todo filme, assim como também a fantástica montagem, que nos faz ser jogados nas cenas de pura emoção (atenção a sequência quando os protagonistas e a nave estão girando em velocidade máxima).
Mas, de todas as partes técnicas que nos causa realmente emoção, é novamente o trabalho do compositor Hans Zimmer: colaborador de quase todos os filmes de Nolan, Zimmer consegue criar uma trilha original, mas que remete aos outros clássicos da ficção científica, como o já citado 2001 e até mesmo Contatos Imediatos de 3º terceiro grau. Sua trilha possui momentos contemplativos e que, ao mesmo tempo, se casa muito bem com as emoções dos personagens principais, principalmente os momentos protagonizados pelo pai (McConaughey) e sua filha (Mackenzie Foy).
Esses dois, aliás, são o coração do filme como um todo, pois realmente nos passam a insuportável sensação da separação um do outro para um bem maior. O drama aumenta ainda mais, pelo fato que para Cooper (Matthew McConaughey) e Brand (Anne Hathaway, ótima) vão numa missão espacial, cuja sensação para eles são semanas, mas para aqueles que vivem na terra se passam anos. Sendo assim, sai a pequena Mackenzie Foy e entra em cena Jessica Chastain (de A Hora Mais Escura) que consegue a proeza de nos fazer acreditar que ela sim foi um dia a filha do protagonista.
Tamanha dedicação do elenco principal faz com que até mesmo não nos incomodemos num primeiro momento com o ato final da trama que, deveria ser primoroso, mas que acaba sendo o momento mais delicado da obra de Nolan. Em seus derradeiros minutos, Nolan presta uma homenagem explicita á 2001: Uma Odisseia no Espaço, mas como eu disse no texto acima, ele exagera na dose de querer explicar o que está acontecendo em cena e acaba não somente prejudicando o resultado final, como também demonstra uma total falta de fé com relação a nós cinéfilos, em achar que talvez não entendêssemos o que está acontecendo em cena. No decorrer do filme, até que o cineasta pisa no freio de não explicar muito (em A Origem ele explicou demais), porque talvez ele estivesse se guardando para esses minutos que com certeza vão dar o que falar.
Com um elenco estelar que inclui Michael Caine, John Lithgow, Casey Affleck, Wes Bentley e Matt Damon, Interestelar com certeza será lembrado como mais um ótimo filme de Christopher Nolan, mas que está alguns anos luz de distância para ser um novo 2001: Uma Odisseia no Espaço.
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