Primeira diretora da
história ao ganhar um Oscar de melhor direção, Kathryn Bigelow provou que tinha
mão firme na realização de filmes sobre as guerras, mas dos quais possuía certo
grau de crítica sobre os conflitos. Títulos como Guerra ao Terror e A Noite
Mais Escura são exemplos de um retrato cru de soldados americanos que, ou eram
jogados numa guerra que não era deles, ou sendo encarregados de procurar e
exterminar apenas um homem. Em tempos atuais, em que o retrocesso comandando
por um conservadorismo assombra o mundo, Kathryn Bigelow decide revisitar o
passado em Detroit em Rebelião, cuja trama ecoa de uma maneira forte e
desconcertante em nosso presente.
A trama se passa no
ano de 1967 na cidade de Detroit, num período que o preconceito racial ainda
era muito forte. Após uma batida policial num bar clandestino, a comunidade
negra se revolta com as autoridades inconsequentes e se criando então uma
verdadeira rebelião por toda a cidade. Não demora muito para que esse conflito
gere uma verdadeira guerra civil local e com inúmeras perdas.
Na virada dos anos 60
para os 70, aconteceu uma luta sem precedentes pelos direitos civis, onde a
comunidade negra lutou como nunca para conseguir o seu lugar ao sol. Ao mesmo
tempo os EUA estavam sendo derrotados na guerra do Vietnã e dando sinais que a
corrupção política estava cada vez mais afetando os cidadãos da época. Numa
época em que á crise e a baixa auto estima faziam nascer o pior do homem,
sobrava para pessoas inocentes sentirem na pele o veneno vindo da intolerância.
Em sua primeira meia
hora de projeção, Kathryn Bigelow retrata o americano derrotado, revoltado e
imprudente. A cineasta faz então questão de retratar essa panela de pressão
naqueles dias, onde vemos soldados paranoicos e afetados pelo que viram no
outro lado do mundo, começar a descontar em pessoas inocentes e que não tiveram
nada a ver com relação ao nascimento desse conflito em Detroit. Ao mesmo tempo,
testemunhamos policiais já convivendo nesse dia a dia da cidade, mas não
sabendo administrar suas próprias ações e gerando um terror psicológico sem
fim.
Mesclando cenas
filmadas com cenas verídicas da época, Kathryn Bigelow busca ao máximo um grau
de verossimilhança em sua reconstituição de época. Assim como Guerra ao Terror,
sua câmera treme, seguindo os seus personagens principais para não perder o
foco e fazendo a gente testemunhar o pesadelo dos quais eles irão encarar. Ao
reconstituir inúmeros fatos ocorridos na época, à cineasta cria então subtramas
e das quais cada uma delas irão dar de encontro num motel e tornando o cenário
num verdadeiro inferno.
Ao chegarmos a esse
ponto, Kathryn Bigelow faz questão de criar planos fechados, com o desejo para
que possamos sentir a tensão e medo do qual os personagens estão sentindo num
espaço tão pequeno. Todo esse cenário de horror é comandado pelo policial
Krauss (Will Poulter, de O Regresso), que acredita que o que está fazendo é o
certo para conter a violência, mas usando métodos imprudentes e levando a todos
para um caminho sem volta. No mesmo local conhecemos o policial Dismukes (John
Boyega, de Star Wars: O Despertar da Força), que tenta a todo custo ajudar os
seus irmãos da comunidade, mas ao mesmo tempo não querendo entrar em conflito
com os demais policiais.
Ambos são dois lados
distintos do conflito, sendo que um é inconsequente, movido pelo racismo e
outro é movido pelo coração, mas tendo medo da retaliação. Em comum, ambos
querem fazer o necessário para cessar o conflito, mas tendo as suas visões
nubladas pelo preconceito, medo e a violência que acabam moldando as suas
ações. O resultado é a perda da vida de inocentes, em uma situação que poderia
ser amenizada através do dialogo, mas que passou muito longe desse cenário.
Com a participação de atores
como Anthony Mackie (Capitão América: Guerra Civil) e Tyler James Williams
(Todo Mundo odeia o Cris), Detroit em Rebelião é um filme que veio na hora
certa para nos servir de alerta, pois vivemos numa realidade em que o fantasma
do conservadorismo e da intolerância de um passado vem cada vez mais nos
assombrando e ameaçando o nosso futuro.